11 novembro 2024

A Decisão do TEDH (392)

 (Continuação daqui)




392. Expandir a liberdade de expressão


Somente este ano, Portugal já foi condenado seis vezes no TEDH por violação do direito à liberdade de expressão. A lista de condenações é a seguinte (no quinto caso da lista, o Estado aceitou a condenação e o pagamento da indemnização por acordo das partes e não houve lugar a acórdão):


-Almeida Arroja c. Portugal, Acórdão de 19 de março de 2024, Requête n.º 47238/19 (CEDH, artigo 10.º 1, liberdade de expressão, violação). 

-Dias dos Santos Ferreira Costa Cabral c. Portugal, Acórdão de 30 de Abril de 2024, TEDH 4. Seção, Requête n.º 25282/18 (CEDH, art.º 10.º § 1, violação). 

-Veiga Cardoso c. Portugal, TEDH, Acórdão de 16 de janeiro de 2024, 4. Seção, Requête n.º 48979/19 (Cedh, art.º 10.º § 1, violação). 

-Ferreira, Victorino de Queirós, TEDH, Acórdão de 11 de junho de 2024, 4. Seção, Requête n.º 23063/18 (Cedh, art.º 10.º § 1, violação).

-Portugal condenado pelo TEDH a duas multas

-Ferreira e Castro da Costa Laranjo c. Portugal, TEDH, 4. Seção, Requêtes n.ºs 33203/20 e 45884/22, Acórdão de 5 de Novembro de 2024 (CEDH, art.º 10.º § 1, violação).  

Fonte: cf. aqui


Dos cinco acórdãos que constam da lista há uma diferença entre o primeiro e os restantes quatro.

O TEDH decide segundo uma de três formações de juízes: Comité (três juízes); Câmara (sete juízes) e Grande Câmara (15 juízes).

Num extremo, a Grande Câmara (15 juízes) serve para julgar os recursos e, no outro extremo, o Comité (3 juízes) serve para julgar os casos vulgares que se enquadram dentro da jurisprudência já estabelecida pelo Tribunal.

Ora, a diferença na lista acima é que os últimos quatro acórdãos são casos banais, todos julgados por um Comité de três juízes. O último acórdão envolvendo a jornalista Tânia Laranjo e a CMTV é o caso típico do confronto entre o direito à liberdade de expressão e o direito à honra, envolvendo um jornalismo agressivo e intrusivo.

O caso Almeida Arroja v. Portugal é um caso especial  - foi considerado um "caso de impacto" no TEDH, daqueles que contribuem para fazer jurisprudência (cf. aqui) -  e por isso foi objecto de decisão por uma Câmara de sete juízes.  

Deixarei de lado a análise dos factores que terão levado a que este caso fosse considerado um caso especial para me concentrar noutro aspecto mais importante.

Se fosse em Portugal, na nossa tradição casuística e excepcionalista do Direito, este caso especial teria sido convertido num caso excepcional (que não é), e a excepcionalidade teria sido invocada para fugir à jurisprudência ou mesmo decidir contra ela.

Mas não foi isso que fez o TEDH na sua tradição jurisprudencialista e democrática. O TEDH aproveitou as características diferenciadas do caso para alargar a jurisprudência sobre a prevalência do direito à liberdade de expressão em relação ao direito à honra.

É isso mesmo que dizem os académicos da Columbia University que se debruçaram sobre o caso (cf. aqui). Ele serviu para expandir a liberdade de expressão, e não para a restringir ou subverter como aconteceu com as decisões dos tribunais portugueses (cf. aqui e aqui).

Não é uma pequena diferença. O TEDH fez exactamente o contrário dos tribunais nacionais pondo em evidência o carácter provinciano, casuístico e anti-democrático da nossa tradição judicial.

(Continua acolá)

Sem comentários: