05 abril 2010

Era a tensão

Visto a esta luz (aqui e aqui), o cristianismo é um grande romance de amor, mais dramático que Romeu e Julieta. É o romance entre um Homem e uma Mulher, entre Cristo e Ekklesia, a comunidade de todos os homens.

Em Cristo reunem-se todas as características do homem romântico, e do homem romântico por excelência. Existia n'Ele um amor sem limites por aquela Mulher, e existia mais do que isso. Existia veneração por Ela ser obra de Deus. No fim, e tal como nos grandes romances de amor, Ele é o primeiro a morrer, e morre pelo amor a Ela.

Existia, porém, algo de mais na personalidade e na vida de Cristo, algo que tem sido um mistério permanente para quem procura explicar a Sua vida e o Seu comportamento na terra. Vale a pena citar Chesterton:

"Os estóicos (...) sentiam-se orgulhosos pelo facto de conseguirem esconder as lágrimas. Mas Cristo nunca escondeu as Suas; mostrou-as claramente, no rosto aberto, à luz do dia, diante da cidade à qual pertencia. Mas escondia alguma coisa. Super- homens solenes e diplomatas imperiais mostraram-se orgulhosos do facto de conseguirem conter a ira. Mas Cristo nunca conteve a Sua; atirou as mesas e as bancas pela escada do templo abaixo, e perguntava às pessoas como esperavam escapar à condenação do inferno. Mas continha alguma coisa. Digo-o com reverência: havia naquela personalidade devastadora algo a que temos de chamar timidez. Havia alguma coisa que Ele escondia aos homens quando subia à montanha para orar. Havia qualquer coisa que ele ocultava permanentemente, por meio de silêncios abruptos ou de isolamentos impetuosos. Havia uma coisa que era grandiosa de mais para Deus nos mostrar quando andou sobre a nossa terra; e eu tenho imaginado, de quando em vez, de que se tratava da alegria". (*)

Não, não era a alegria. Era a tensão.
E foi neste clímax de tensão que Cristo morreu por ela, Ekklesia. Com a Sua morte terminou também o romance, o romance da Velha Aliança e do Antigo Testamento. Mas Deus não permitiu que Ekklesia morresse logo atrás dele, qual Julieta ou qual Isolda. Pelo contrário, fê-Lo ressuscitar três dias depois para que começasse um novo romance. É esse romance que estamos a viver.
(*) G. K. Chesterton, Ortodoxia, Lisboa: Alêtheia, pp. 228-9.

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