05 abril 2010

paradigma

(Continuação daqui)

Nas grandes histórias de amor romântico gravadas na literatura Ocidental nunca há sexo. Estou a pensar, em primeiro lugar, em Romeu e Julieta, e em Tristão e Isolda, mas também em histórias semelhantes da literatura Oriental. Na literatura portuguesa, o amor de perdição entre Teresa e Simão não foge à regra. Não há sexo. A contenção sexual parece ser uma condição essencial do amor ideal entre um homem e uma mulher.
Nem poderia ser de outro modo. Estas histórias de amor acabam sempre em clima de tensão, onde todos os leitores anseiam pelo desfecho esperado, finalmente a relação sexual que culmina o grande amor entre um homem e uma mulher, e nunca o vão ter. O sexo teria acabado com o romance, e seria necessário recomeçar de novo. Assim, fica a tensão para sempre, e cada leitor é deixado a imaginar o que seria a relação sexual entre o Romeu e a Julieta, o Tristão e a Isolda, o Simão e a Teresa. Seria a relação sexual que cada homem e cada mulher deste mundo gostariam de ter.
Porém, a chave para esta relação sexual ideal é a contenção sexual. Não existe romantismo nenhum num homem que tem relações sexuais todos os dias, e menos ainda numa mulher. Ambos reduziram a sua relação ao sexo e a um sexo mecânico e banalizado. A relação sexual ideal depende de um romance prévio e é o culminar do romance. Depois de cada relação sexual é necessário começar o romance de novo, e isso exige tempo e contenção sexual.
Os grandes escritores românticos, incluindo os grandes poetas, eram eles próprios, em geral, homens de grande contenção sexual. Normalmente não eram casados e, quando foram, geralmente não deram bons maridos. A sua sexualidade parecia ser vivida de forma esporádica quando se envolviam em aventuras amorosas, seguidas de períodos de abstinência pelo meio. Em Portugal, Camilo Castelo Branco não pode deixar de vir à memória.
Amor e contenção sexual parecem ser então os dois pilares essenciais do amor romântico e os pilares capazes de conduzir à relação sexual ideal, aquela que culmina esse amor num clímax indescritível de intensidade e ardor. Existe, porém, mais um pilar necessário para se chegar tão alto, o qual também está presente nas grandes histórias de amor da literatura Ocidental e Oriental: o homem morre sempre primeiro que a mulher.
Romeu morre primeiro que Julieta, e Tristão morre primeiro que Isolda. No romance de Camilo que, apesar de tudo não se pode situar ao nível dos anteriores, existe uma pequena variante, mas que não altera a regra. Teresa morre primeiro que Simão, mas a verdade é que o desterro de Simão representa, para todos os efeitos, a morte dele aos olhos de Teresa, a qual morre logo a seguir e por causa disso. Nos grandes casos de amor, o homem é sempre o sacrificado ao amor pela mulher. A mulher está num plano superior, o homem morre por ela.
Chegado a este ponto é altura para perguntar, será que existe por aí na vida real, ao menos como paradigma, o homem romântico por excelência, que é o homem movido por um grande amor, o homem que põe a mulher num pedestal e está pronto a sacrificar-se por ela, o homem, finalmente, que é mestre na arte da contenção sexual?
Será que este homem existe, ao menos como paradigma?

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