Volto ao tema: Porque é que os juristas portugueses, na sua generalidade - juizes incluídos - não sabem julgar? A resposta, em parte, já foi dada - porque o povo português não possui sentido de justiça - mas esta é uma resposta claramente insatisfatória porque apenas levanta outra questão: Porque é que o povo português não possui sentido de justiça?
A cultura portuguesa, sendo uma cultura profundamente católica, une-se em torno da ideia de verdade - e a verdade não admite litígio. Nesta cultura, compete à sua elite - os professores, que em primeiro lugar foram os padres - determinar o que é a verdade. Não há mais nada a julgar. O único julgamento que esta cultura admite, que é o julgamento entre a verdade e a mentira, compete aos professores, não aos juristas. Por isso, nesta cultura o lugar natural reservado aos juristas é um lugar secundário - o de condenar aqueles que não se conformam com a verdade -, não o de julgar.
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A história do sistema judicial português não mostra outra coisa. Ele não está feito, nem nunca foi feito, para julgar. Ele foi desde o início feito para condenar. A história da Inquisição ilustra a este respeito, e com enorme clareza, a natureza do sistema judicial português. Os arguidos eram julgados pelo clero e, sendo considerados culpados, eram então entregues ao braço secular para que lhes aplicasse as penas. Esperar que o povo português possua capacidade para julgar é uma quimera. Esperar que os juristas - juizes incluídos - a possuam, especialmente em regime democrático, quando eles próprios saem das entranhas do povo, é outra quimera. A razão é que o povo português nunca foi chamado a julgar, e por isso não sabe julgar. Essa é uma tarefa reservada à sua elite natural - a classe dos professores. Quando esta elite está arredada dos postos do poder, não existe justiça no país.
O juiz português típico é um condenador, não um julgador, porque é isso que ele sempre fez e é isso que ele sabe fazer. Os arguidos que lhe chegam às mãos já se encontram culpados, competindo ao juiz somente ponderar a pena e aplicá-la. Diferente é a função do juiz inglês ou americano, e geralmente, do juiz de cultura protestante. A ideia central que une esta cultura é a ideia de justiça. A função do juiz aqui é a de arbitrar entre as duas partes em litígio (litigation) e determinar onde está a razão, isto é, fazer justiça. O juiz desta tradição é um verdadeiro julgador.
A diferença entre o juiz na tradição católica - um condenador - e o juiz na tradição protestante - um julgador - encontra o seu correspondente na diferença entre o professor na tradição católica e o professor na tradição protestante - a qual já aflorei aqui e à qual voltarei no futuro. O nome é o mesmo em ambos os casos, mas as realidades culturais subjacentes estão a um oceano de distância.
A cultura portuguesa, sendo uma cultura profundamente católica, une-se em torno da ideia de verdade - e a verdade não admite litígio. Nesta cultura, compete à sua elite - os professores, que em primeiro lugar foram os padres - determinar o que é a verdade. Não há mais nada a julgar. O único julgamento que esta cultura admite, que é o julgamento entre a verdade e a mentira, compete aos professores, não aos juristas. Por isso, nesta cultura o lugar natural reservado aos juristas é um lugar secundário - o de condenar aqueles que não se conformam com a verdade -, não o de julgar.
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A história do sistema judicial português não mostra outra coisa. Ele não está feito, nem nunca foi feito, para julgar. Ele foi desde o início feito para condenar. A história da Inquisição ilustra a este respeito, e com enorme clareza, a natureza do sistema judicial português. Os arguidos eram julgados pelo clero e, sendo considerados culpados, eram então entregues ao braço secular para que lhes aplicasse as penas. Esperar que o povo português possua capacidade para julgar é uma quimera. Esperar que os juristas - juizes incluídos - a possuam, especialmente em regime democrático, quando eles próprios saem das entranhas do povo, é outra quimera. A razão é que o povo português nunca foi chamado a julgar, e por isso não sabe julgar. Essa é uma tarefa reservada à sua elite natural - a classe dos professores. Quando esta elite está arredada dos postos do poder, não existe justiça no país.
O juiz português típico é um condenador, não um julgador, porque é isso que ele sempre fez e é isso que ele sabe fazer. Os arguidos que lhe chegam às mãos já se encontram culpados, competindo ao juiz somente ponderar a pena e aplicá-la. Diferente é a função do juiz inglês ou americano, e geralmente, do juiz de cultura protestante. A ideia central que une esta cultura é a ideia de justiça. A função do juiz aqui é a de arbitrar entre as duas partes em litígio (litigation) e determinar onde está a razão, isto é, fazer justiça. O juiz desta tradição é um verdadeiro julgador.
A diferença entre o juiz na tradição católica - um condenador - e o juiz na tradição protestante - um julgador - encontra o seu correspondente na diferença entre o professor na tradição católica e o professor na tradição protestante - a qual já aflorei aqui e à qual voltarei no futuro. O nome é o mesmo em ambos os casos, mas as realidades culturais subjacentes estão a um oceano de distância.
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Ao juiz-condenador exige-se um espírito predominantemente orientado para o particular e o concreto, para os factos (Quem cometeu o crime? Quantas vítimas houve e quem são? Quais foram as circunstâncias do crime, o local, a hora?, etc.) que corresponde, de resto, ao espírito português e católico. Pelo contrário, ao juiz-julgador exige-se um espírito predominantemente orientado para o geral e o abstracto, para as ideias (a ideia de justiça, em primeiro lugar), que corresponde ao espírito anglo-saxónco e protestante. Ao juiz-condenador exige-se também minúcia, que é necessária ao apuramento dos factos. Pelo contrário, ao juiz-julgador exige-se afastamento (detachment), aquela qualidade do espírito anglo-saxónico e protestante que Fernando Pessoa lamentava não existir no português.
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(Imagem: Juiz americano)
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