03 outubro 2024

A Decisão do TEDH (365)

 (Continuação daqui)



365. Felizmente

Um dos documentos mais paradigmáticos do moderno direito à liberdade de expressão é a Primeira Emenda à Constituição Americana, que diz assim:

"O congresso não deverá fazer qualquer lei a respeito de um estabelecimento de religião, ou proibir o seu livre exercício; ou restringindo a liberdade de discurso, ou da imprensa; ou o direito das pessoas de se reunirem pacificamente, e de fazerem pedidos ao governo para que sejam feitas reparações de queixas" (cf. aqui).

Como referi anteriormente (cf. aqui), e a Primeira Emenda confirma, a prioridade da liberdade de expressão é concedida à religião e ao reconhecimento do pluralismo dos caminhos para Deus, bem como à proibição de o Estado se intrometer nesses caminhos.

Felizmente, na altura em que a Constituição Americana foi aprovada o catolicismo estava proibido nos EUA. Na realidade, o catolicismo estava proibido na Inglaterra e, portanto, também na sua colónia americana (uma proibição à qual a Primeira Emenda viria a pôr termo). Dentre os 56 pais fundadores americanos que assinaram a Declaração de Independência (1776) existia apenas um católico, o aristocrata Charles Carroll of Carrolton.

Felizmente porque se o catolicismo tivesse prevalecido na origem da nação americana, os EUA seriam hoje um país como o México ou o Brasil, vastas multidões em pobreza a serem confortadas por padres católicos. Os EUA são distintamente uma criação protestante expressa na sigla que melhor define a sua cultura de origem: WASP - White, Anglo-Saxonic and Protestant.

Se a cultura dominante fosse católica, a Primeira Emenda, em lugar de ter a formulação citada acima, seria assim: "Como todos sabem, a religião católica é a única e verdadeira religião, competindo ao Estado zelar pelo cumprimento das suas a verdades e penalizar com multas, açoites, prisão e até a morte quem as puser em causa". 

Em seguida, os pais fundadores americanos teriam anunciado a concessão de vistos de imigração a inquisidores especialmente vindos de Espanha e Portugal, que eram os países que, na altura [e ainda hoje] se especializavam na matéria, para assegurar o cumprimento da Lei.

Por mais de uma vez referi que o processo crime que deu origem ao acórdão do TEDH Almeida Arroja v. Portugal foi uma congeminação de juristas reunidos em torno do Departamento da Direito da Universidade Católica do Porto, a que logo durante o julgamento de primeira instância eu identifiquei como o Gangue da Católica. Mais tarde, quando o processo subiu ao Tribunal da Relação do Porto, a este Gangue viria a juntar-se o juiz Pedro Vaz Patto na sua dupla ligação ao departamento de Direito da UCP e à direcção da Igreja Católica (cf. aqui).

É um  privilégio ver agora uma das mais antigas e reputadas universidades americanas onde, inclusivé, se formaram alguns dos pais fundadores americanos, eleger o caso Almeida Arroja v. Portugal como um caso de estudo sobre a liberdade de expressão (cf. aqui).

E se, do ponto de vista religioso, a perseguir-me eu tive a Universidade Católica do Porto, qual é a filiação religiosa da Columbia University que celebra a minha vitória e a vitória da liberdade de expressão no TEDH?

Naturalmente, protestante (anglicana) (cf. aqui)

Sem comentários: