Depois de ter defendido que a cultura portuguesa (católica) envolve a censura como um dos seus elementos essenciais e estruturantes, afirmei neste post que os partidos políticos são os principais agentes da censura em democracia, prometendo voltar mais tarde ao assunto. Também afirmei que, na nossa cultura, a opinião independente tende a ser censurada e, no limite, banida do espaço público pelos partidos políticos.
Eu tinha agora aqui duas teses para provar, mas um dilema. Se eu estivesse num país Prot desenvolvia um argumento abstracto, respeitando as regras da racionalidade e da lógica e despachava o assunto num instante. Mas eu estou em Portugal e, como norma, tudo o que seja argumento abstracto passa ao lado dos portugueses. Não só não lhes diz nada - literalmente, não os excita -, mas também, como é próprio da incompreensão, até se riem só da menção da palavra (Veja neste post como o EPC se divertiu sobretudo quando mencionei a capacidade do pensamento abstracto. Veja também aqui como o Joaquim exprimiu, em termos abstractos, vinte princípios que lhe guiam a vida, e ninguém lhe ligou nenhuma).
Então, e em Portugal como é que se faz, se se pretende provar um argumento? Tem de se começar com casos concretos, histórias de preferência altamente pessoalizadas, se possível metendo sangue, nem que seja por palavras. É assim que os portugueses ficam excitados e agarrados ao argumento. Foi isso que eu decidi fazer aqui, aqui e aqui e resultou em cheio. Nada de pensamento abstracto, nada de Kant (o principal cultor moderno do pensamento abstracto), nada de cultura Prot. Não dá em Portugal.
.
Numa cultura como a nossa que privilegia o poder, que espera do poder a chuva e o bom tempo, o regime democrático leva os partidos a ocuparem todas as instituições que influenciam a opinião pública, que, por assim dizer, fazem a cabeça às pessoas. As principais são os media (jornais, radio, televisão) e as instituições de ensino (universidades, escolas). Com a democracia e o decorrer do tempo estas instituições ficam solidamente partidarizadas.
Suponha agora que, numa destas instituições, vg., os media, aparece um homem a emitir opiniões em público que desagradam a um certo partido político. Este homem vai ganhar uma tribo de adversários - o partido político visado, pronto a disparar sobre ele e, no limite, a silenciá-lo.
Duas situações são agora possíveis. Na primeira, o autor das novidades (para usar a linguagem da Inquisição) é ele próprio membro de um partido político. Neste caso, ele possui uma tribo para o defender na redacção do jornal, rádio ou televisão e nos media em geral. Assim sendo, o partido visado vai reagir de forma contida - se é que vai desferir algum ataque de todo - porque qualquer ataque ao autor das novidades pode desembocar numa guerra interpartidária. O desfecho mais provável, excepto em situações extremas, é, pois, o de que não aconteça nada ao autor das novidades.
Na segunda situação é diferente. O autor das novidades é um cidadão independente e não pertence a nenhum partido político. Neste caso, as suas opiniões, as quais desagradam a um certo partido político, fazem-no ganhar uma tribo de adversários, sem que ele tenha, ao mesmo tempo, uma tribo de amigos - um partido - para o proteger e defender nas redacções dos jornais, das rádios e das televisões, e na opinião pública em geral. Ele vai ser atacado pela certa e no limite vai ser eliminado. É uma questão de tempo.
Um homem ou grupo de homens possuindo ligações a um partido político tem alguma liberdade de opinião em Portugal, sob o regime democrático - embora uma liberdade relativa e sujeita à ortodoxia do partido. Se não possuir tais ligações, a prazo será calado. A democracia promove o acesso à ribalta pública apenas a homens dependentes das ligações partidárias. E tira de lá todos os independentes. Ou acha que algum destes episódios me teria acontecido se eu fosse membro de um partido político (aqui, aqui, aqui e aqui)? Foi a multiplicidade de episódios como este, o desgaste que eles causam, e as consequências que inevitavelmente tinham na minha vida pessoal, profissional e familiar que me levaram a abandonar toda a intervenção pública regular. E eu até era muito bem pago, como acontece com qualquer avis rara.
Eu tinha agora aqui duas teses para provar, mas um dilema. Se eu estivesse num país Prot desenvolvia um argumento abstracto, respeitando as regras da racionalidade e da lógica e despachava o assunto num instante. Mas eu estou em Portugal e, como norma, tudo o que seja argumento abstracto passa ao lado dos portugueses. Não só não lhes diz nada - literalmente, não os excita -, mas também, como é próprio da incompreensão, até se riem só da menção da palavra (Veja neste post como o EPC se divertiu sobretudo quando mencionei a capacidade do pensamento abstracto. Veja também aqui como o Joaquim exprimiu, em termos abstractos, vinte princípios que lhe guiam a vida, e ninguém lhe ligou nenhuma).
Então, e em Portugal como é que se faz, se se pretende provar um argumento? Tem de se começar com casos concretos, histórias de preferência altamente pessoalizadas, se possível metendo sangue, nem que seja por palavras. É assim que os portugueses ficam excitados e agarrados ao argumento. Foi isso que eu decidi fazer aqui, aqui e aqui e resultou em cheio. Nada de pensamento abstracto, nada de Kant (o principal cultor moderno do pensamento abstracto), nada de cultura Prot. Não dá em Portugal.
.
Numa cultura como a nossa que privilegia o poder, que espera do poder a chuva e o bom tempo, o regime democrático leva os partidos a ocuparem todas as instituições que influenciam a opinião pública, que, por assim dizer, fazem a cabeça às pessoas. As principais são os media (jornais, radio, televisão) e as instituições de ensino (universidades, escolas). Com a democracia e o decorrer do tempo estas instituições ficam solidamente partidarizadas.
Suponha agora que, numa destas instituições, vg., os media, aparece um homem a emitir opiniões em público que desagradam a um certo partido político. Este homem vai ganhar uma tribo de adversários - o partido político visado, pronto a disparar sobre ele e, no limite, a silenciá-lo.
Duas situações são agora possíveis. Na primeira, o autor das novidades (para usar a linguagem da Inquisição) é ele próprio membro de um partido político. Neste caso, ele possui uma tribo para o defender na redacção do jornal, rádio ou televisão e nos media em geral. Assim sendo, o partido visado vai reagir de forma contida - se é que vai desferir algum ataque de todo - porque qualquer ataque ao autor das novidades pode desembocar numa guerra interpartidária. O desfecho mais provável, excepto em situações extremas, é, pois, o de que não aconteça nada ao autor das novidades.
Na segunda situação é diferente. O autor das novidades é um cidadão independente e não pertence a nenhum partido político. Neste caso, as suas opiniões, as quais desagradam a um certo partido político, fazem-no ganhar uma tribo de adversários, sem que ele tenha, ao mesmo tempo, uma tribo de amigos - um partido - para o proteger e defender nas redacções dos jornais, das rádios e das televisões, e na opinião pública em geral. Ele vai ser atacado pela certa e no limite vai ser eliminado. É uma questão de tempo.
Um homem ou grupo de homens possuindo ligações a um partido político tem alguma liberdade de opinião em Portugal, sob o regime democrático - embora uma liberdade relativa e sujeita à ortodoxia do partido. Se não possuir tais ligações, a prazo será calado. A democracia promove o acesso à ribalta pública apenas a homens dependentes das ligações partidárias. E tira de lá todos os independentes. Ou acha que algum destes episódios me teria acontecido se eu fosse membro de um partido político (aqui, aqui, aqui e aqui)? Foi a multiplicidade de episódios como este, o desgaste que eles causam, e as consequências que inevitavelmente tinham na minha vida pessoal, profissional e familiar que me levaram a abandonar toda a intervenção pública regular. E eu até era muito bem pago, como acontece com qualquer avis rara.
Sem comentários:
Enviar um comentário