11 março 2009

wicked


David Hume (1711-1776) era doze anos mais velho que Adam Smith (1723-1790). Nos últimos anos, viviam a dez quilómetros de distância na Escócia, David Hume vivia sozinho em Edimburgo, Adam Smith com a mãe em Kircaldy. Na casa de Hume havia um quarto para Smith: "Your chamber in my house is always unoccupied" (op. cit., p. 185), escrevia Hume ao amigo, reclamando a sua visita, dois meses antes de morrer.

Antes da sua morte, Hume nomeou Smith executor testamentário da sua obra, indicando-lhe precisamente o que era para ser publicado e o que não era. Em Dezembro de 1776, oito meses após a morte de Hume, o seu editor, William Strahan, escreveu a Smith solicitando-lhe mais material do filósofo para publicação, especialmente cartas. Smith respondeu-lhe assim:

"I know he always disliked the thought of his letters being published. He had been in long and intimate correspondence with a relation of his own who dyed a few years ago. When that genteman's health began to decline he was extremely anxious to get back his letters, least the heir should think of publishing them. They were accordingly returned and burnt as soon as returned. If a collection of Mr. Hume's letters [were to be made available] ... Many things would be published not fit to see the light to the great mortification of all those who wish well to his memory ..." (op. cit., pp. 223-4).

Escreve agora Ian S. Ross, o editor principal, no Prefácio da Correspondence of Adam Smith que tenho vindo a citar referindo-se à morte de Smith em 1790: "This feeling no doubt caused Smith to give instructions to his executors Joseph Black and James Hutton to commit his papers to the flames in the last week of his life" (op. cit., p. viii). Ross parece um tanto perplexo perante a decisão e relembra uma afirmação de Smith nas suas "Lectures on Rethoric and Belles Lettres": "The smallest circunstances, the most minute transactions of a great man, are sought after with eagerness", tanto mais quanto é certo que Smith era ele próprio um apreciador dos pequenos detalhes da vida dos grandes homens: "We recall, too, the pleasure he took himself in knowing such details as that Milton wore latchets in his shoes". (op. cit., p. viii).

Porém, mesmo se a maior parte da correspondência de Hume e de Smith foi mandada destruir pelos próprios, naquela que sobreviveu, são frequentes as passagens, para além daquelas que já citei, que sugerem a homossexualidade de ambos, a relação íntima que mantiveram em vida e os períodos que passaram a sós. (Cf. também aqui, aqui e os últimos posts abaixo).

Em 1765 estavam ambos em França, o centro da imoralidade da época, David Hume como Embaixador de Inglaterra, Adam Smith como tutor do Duke of Buccleugh. Então em viagem por Toulouse acompanhando o discípulo, Smith escreveu assim ao amigo em Paris sobre os progressos do seu educando: "He has read almost all your works several times over, and was it not for the more wholesome doctrine which I take care to instill into him, I am afraid he might be in danger of adopting some of your wicked Principles..." (op. cit., p. 105). "Wicked" significa perverso, pecaminoso, corrompido.

Adam Smith sabia que a filosofia moral de David Hume era uma moralidade perversa que se destinava em primeiro lugar a cobrir a sua própria homossexualidade. Ainda hoje, passados mais de duzentos anos, os admiradores de David Hume parecem exibir uma certa propensão para apreciar as protuberâncias do corpo humano masculino.

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