A história da intolerância à lactose, um açúcar do leite, é um exemplo extraordinário da interacção entre os genes e a cultura, um tema que já abordei em posts anteriores e que o Rui Albuquerque fez o favor de enquadrar politicamente.
O leite é um alimento excelente para os primeiros anos de vida, mas após os quatro anos de idade muitas pessoas não o conseguem digerir por falta de lactase (um enzima) no intestino (deficiência de lactase). A incidência da deficiência de lactase não é porém uniforme. Afecta, por exemplo, 90 a 95% da população em África, mas apenas 5% na Suécia.
Estas diferenças são o resultado de um processo de selecção natural que ocorreu nos últimos 10.000 anos. Com a sedentarização e o desenvolvimento da agricultura e da pecuária, o leite passou a estar disponível para consumo humano, em quantidades significativas, e os indivíduos com os genes necessários para o digerirem, na idade adulta, sobreviveram mais e reproduziram-se mais, tendo passado esta característica a muitos dos seus descendentes. O contrário ocorreu com os indivíduos que não eram portadores destes genes.
As populações que aprenderam mais cedo a domesticar e a criar animais desenvolveram uma cultura que influenciou o processo de selecção natural e diferenciou os indivíduos. A selecção natural não afectou, porém, apenas a capacidade dos adultos digerirem leite. Sabemos que afectou muitas outras características das populações e é por isso que as podemos distinguir, física e culturalmente, umas das outras. A diversidade necessária para a sobrevivência da espécie é isto mesmo.
150.000 anos depois dos nossos antepassados terem migrado do Vale do Rift, é óbvio que um sueco poderá ter alguma dificuldade em regressar às origens. Nada de surpreendente!
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