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Esta cultura iluminista é substancialmente definida pelos direitos de liberdade, parte da liberdade como valor fundamental e medida de todas as coisas, a liberdade de escolha religiosa, que inclui a neutralidade religiosa do Estado, a liberdade de exprimir a própria opinião, desde que não se meta em dúvida, precisamente, este cânone, a organização democrática do Estado (...)
(Nesta cultura) o conceito de discriminação é cada vez mais alargado e, assim, a proibição da discriminação pode transformar-se, cada vez mais, numa limitação da liberdade de opinião e da liberdade religiosa. Daqui a pouco, deixará de poder afirmar-se que a homossexualidade, como ensina a Igreja Católica, representa uma desordem objectiva na estruturação da existência humana. E o facto de a Igreja estar convencida de não ter o direito de decidir sobre a ordenação sacerdotal da mulher é considerado, por alguns, como inconciliável com o espírito da Constituição Europeia. É evidente que este cânone da cultura iluminista, que nada tem de definitivo, contém valores importantes que nós, precisamente por sermos cristãos, não queremos e não podemos rejeitar, mas também é evidente que a concepção mal definida - ou mesmo não definida - de liberdade, que está na base desta cultura, comporta inevitáveis contradições, e é evidente que, (...) comporta limitações da liberdade que há uma geração atrás não conseguiríamos sequer imaginar. Uma ideologia confusa de liberdade conduz a um dogmatismo que se revela cada vez mais hostil à liberdade.
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Estas filosofias são caracterizadas pelo facto de serem positivistas e, por isso, contrárias à metafísica, não havendo espaço para Deus nos seus pressupostos. Baseiam-se numa autolimitação da razão positiva, que é adequada ao âmbito técnico, mas que, quando é generalizada, comporta, ao invés, uma mutilação do homem. Daqui resulta que o homem deixa de admitir qualquer instância moral exterior aos seus cálculos e, como já vimos, até o conceito de liberdade, que inicialmente parecia poder expandir-se de maneira ilimitada, conduz, por fim, à autodestruição da liberdade.
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Deste modo, a recusa a fazer referência a Deus (na Constituição Europeia) não é expressão de uma tolerância que quer proteger as religiões não-teístas e a dignidade dos ateus e dos agnósticos, mas a expressão de (um dogmatismo) que gostaria de apagar Deus da vida pública da humanidade e remetê-lo para o âmbito subjectivo das culturas residuais do passado"
Joseph Ratzinger, A Minha Vida - Autobiografia, Lisboa: Livros do Brasil, 2005, pp. 125-130)
2 comentários:
Um texto completamente absurdo. Se a União Europeia não é um regime confessional, qualquer alusão dessas não faria qualquer sentido.
Acho que fica definitivamente provado que já não são os liberais que defendem a liberdade mas os verdadeiros religiosos.
Penso que dentro de poucos anos não haverá mais que um punhado de homens que consigam compreender textos como este.
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