16 julho 2007

combinação tendencialmente explosiva

Quando, em nome da democracia, a autoridade suprema e absoluta da sociedade é colocada nas mãos de um povo católico, este não sabe o que fazer dela, e menos ainda como exercê-la. Na tradição católica, ao contrário da tradição protestante, a autoridade suprema e absoluta sempre pertenceu a uma entidade que é exterior ao povo e à sociedade - o Papa.

A função principal da autoridade é a de garantir a liberdade, e a grande tradição de liberdade que existe entre os povos católicos é uma consequência directa da autoridade suprema e absoluta do Papa. Porém, o exercício da autoridade que garante a liberdade, é um exercício muito subtil, e de que o Papa fornece o exemplo. O Papa exerce a sua autoridade, não tanto por acção, mas sobretudo por inacção. Enquanto autoridade suprema e absoluta, a função principal do Papa é estar lá - só sendo chamado a agir quando algum homem ou grupo de homens ameaça a liberdade de outro homem ou grupo de homens.

Porém, ninguém pode razoavelmente esperar que o povo compreenda esta subtileza do exercício da autoridade, que é condição da liberdade. Pelo contrário. Por isso, quando posta nas mãos de um povo católico, a autoridade - ainda por cima suprema e absoluta - rapidamente se converte num convite permanente para a acção, num exercício permanente do poder, numa emissão sucessiva e às vezes frenética de ordens (leis) que visam comandar a vida dos outros homens e a controlar. O resultado é que a democracia num povo de tradição católica acaba invariavelmente por resultar na opressão.

A expressão tirania da maioria tem sido frequentemente utilizada para descrever um dos resultados possíveis da democracia. Porém, é nos países católicos que ela ganha o seu significado mais profundo, porque é aí que ela tende a assumir a sua forma mais cruel - a de uma tirania irresponsável da maioria. Na tradição protestante, cada homem - e todos os homens, o povo - estabelece uma aliança (covenant) com Deus, de quem recebe autoridade e perante quem, em contrapartida, assume responsabilidade pelo exercício dessa autoridade. Pelo contrário, na tradição católica, nenhum homem do povo estabelece uma tal aliança com Deus, a qual é estabelecida somente com alguns eleitos - os apóstolos ou os bispos da Igreja.

Por isso, num país de tradição católica, a democracia põe nas mãos do povo uma combinação que é uma combinação tendencialmente explosiva: a autoridade suprema e absoluta da sociedade - que o povo entende como poder supremo e absoluto sobre a vida dos outros - acompanhada da mais completa irresponsabilidade.

3 comentários:

ablogando disse...

"profundamente católico, quando religioso, o português é ao mesmo tempo anticlerical; estudioso e cumpridor, não respeita, por princípio, o mestre; altamente competente quando profissional, tem dificuldade em adaptar-se ao trabalho de conjunto": o passo que citou do texto de Salazar revela, da parte deste, um profundo conhecimento "manholas" (para utilizar a alcunha pela qual o seu pai seria conhecido) da psicologia do português provinciano médio. Mas ser "manholas" revela igualmente a estreiteza de vistas própria desse estrato do "país real", igualmente presente em Cavaco Silva e José Sócrates, para não falar de Alberto João Jardim (este, por detrás da sua aparente boçalidade de modos, apesar de tudo bastante mais inteligente do que todos eles).
A manholice consiste exactamente em confundir o catolicismo com o saber do manholas. Ele, Salazar, é a verdade, porque ele falou para os outros manholas na perspectiva manholas do catolicismo. Fiz-me emtender?

CN disse...

Bem, o problema principal nos paises católicos foi mesmo o fim da monarquia substituida (induzida na WWI pelos progressistas americanos de Woodrow Wilson) por repúblicas.


França
Espanha
Portugal
Alemanha (cerca metade Católico, sob a república acabou no nazismo)
Austria (caiu na esfera Nazi)
Itália (no confronto Rei versus Mussolini)
Rússia (se considerarmos que os ortodoxos são uma espécie de Católicos, sob a república acabam no comunismo)

Era bem útil que a "WWI" fosse reconhecida como o grande destruidor da civilizaçao europeia e do seu "periodo liberal" (comparativamente ao pós-WWI).

Todos tiveram culpa, mas foi mesmo Woodrow Wilson e o seu messianismo democrático anti-monarquico que lançou o caos.

Anónimo disse...

Pois CN, parece que o Sr. Wilson é mesmo um grande inimigo da civilização. Foi durante sua fase de biberão que essa criança precoce impôs a republica á França. Não contente com isso, e sem precisar que a 1ª GM terminasse, forçou os russos a substituírem o tirano que era o Czar por outro tipo de tirania.
A sua acção algo incompleta em Espanha explica o movimento pendular que estes pais tem tido entre a república e a monarquia.
Mas esquecendo o seu fracasso em Espanha, o insistente Wilson ressuscita em 1946, duas décadas depois de finar, para impor aos pobres italianos o ímpio regime republicano.
Há suspeitas do envolvimento do ainda não nascido Sr. Wilson na formação da Confederação Helvética. É graças á sua influencia perniciosa que esse país, apesar de ser meio católico, nunca teve a alegria de ser governado por um rei.

EMS