02 setembro 2025

A ditadura da toga (4)

(Continuação daqui)



4. Um mundo de impunidade

Existe uma tendência para olhar para o liberalismo como uma temática essencialmente económica. Mas até o grande economista liberal Friedrich Hayek começou a escrever sobre o liberalismo sob o ponto de vista económico e acabou a escrever sobre justiça na sua célebre trilogia "Law, Legislation and Liberty".

Na minha conversa com o Miguel Milhão, que tem um projecto liberal para Portugal (cf. aqui), salientei que algumas das liberdades fundamentais de uma sociedade livre não são de ordem económica, mas de ordem judicial. A liberdade joga-se na justiça, muito mais do que na economia.

Por exemplo, a liberdade de acusação criminal, que até Salazar garantia aos portugueses (cf. aqui), está-lhes vedada no regime democrático. O monopólio da acusação criminal que, em Portugal como no Brasil, está reservado ao Ministério Público, que é o herdeiro moderno da Inquisição, é o mais danoso monopólio do Estado que se pode imaginar, muito pior do que qualquer monopólio de natureza económica. Ele põe pessoas decentes na prisão e dá liberdade a criminosos.

Nada contribui mais para a ditadura da toga do que este monopólio do Estado. Ele permite a qualquer magistrado do Ministério Público - que está protegido por um regime de imunidade e que não responde, portanto, por aquilo que faz - acusar um inocente ou inocentar um criminoso, pervertendo por completo a justiça e inviabilizando a liberdade. Os homens da toga vivem num mundo de impunidade.

O juiz Alexandre de Moraes, que liderou a acusação contra Bolsonaro e faz parte do colectivo que o vai julgar, é um antigo procurador do Ministério Público brasileiro. Se outros indícios não existissem este bastaria talvez para fazer desconfiar da natureza inquisitorial de todo o processo. Acusar um inocente é o que o Ministério Público fez antes ao Presidente Lula, levando-o à prisão, para depois se concluir que a condenação era injusta por ter havido irregularidades no processo.

Se acusar um inocente é o pior que o monopólio estatal da acusação criminal pode produzir, inocentar um criminoso também corrompe a justiça porque dá liberdade aos criminosos. Um caso paradigmático aconteceu esta semana em Portugal. Uma procuradora do MP de Braga inocentou os ministros Paulo Rangel e José Manuel Fernandes do crime de financiamento ilegal de partido porque eles não tinham consciência de estarem a cometer um crime. Vale a pena citar (cf. aqui).

"Segundo o despacho do MP, a realização do evento conferiu visibilidade ao PSD, mas os eurodeputados e restantes visados não tinham consciência de que a sua conduta configuraria um crime. Por isso, aplicou-se o princípio jurídico do “erro sobre a ilicitude”, que exclui a responsabilidade penal quando o agente desconhece que a conduta é ilegal".

Imagine-se, o grande Professor Paulo Rangel (cf. aqui), não tinha consciência de que estava a cometer um crime. Coitadinho. Ninguém acredita. A verdadeira razão é que atacar os ministros Rangel e Fernandes significaria que tão cedo a procuradora  Carolina Marques Dias não seria promovida. 

Na tradição católica e inquisitorial o Ministério Público está sempre do lado do poder.  E os homens da toga são inimputáveis e não se criminalizam uns aos outros. (Fazem todos parte da mesma corporação, a Ordem dos Advogados, mesmo que mais tarde venham a enveredar pela carreira de juiz ou do MP com a inscrição suspensa na Ordem).

(Continua acolá)

Sem comentários: