(Continuação daqui)
338. Será?
Quando o catolicismo foi proibido em Inglaterra pelo Act of Uniformity (1559), uma proibição que se prolongou por mais de dois séculos, um dos argumentos utilizados foi o de que não se podia confiar nos católicos, nunca se sabia se a sua lealdade era para com o Estado ou para com a Igreja, se para com o Rei ou para com o Papa.
Apesar de, a partir do fim do século XVIII, a proibição ter sido progressivamente relaxada, ainda hoje os católicos não podem ocupar cargos de governação em Inglaterra, e o argumento é o mesmo - não se pode confiar neles, nunca se sabe onde estão as suas lealdades. (Tony Blair, por exemplo, converteu-se ao catolicismo - a religião da sua mulher - mas só depois de abandonar o cargo de primeiro-ministro).
Durante os séculos da proibição, a desconfiança dos britânicos em relação aos católicos era particularmente acentuada face aos jesuítas. Ninguém era tão militantemente católico como os jesuítas ao ponto de serem conhecidos como "Os Soldados do Papa"; ninguém fazia tão habilmente política disfarçada de religião, e gostava tanto de poder, como os jesuítas; ninguém era tão leal ao Papa como os jesuítas. Deles se podia dizer com toda a propriedade que eram "Mais papistas que o Papa".
Acontece rigorosamente o mesmo em relação aos Focolares, os "Jesuítas de Saias", a "Armada do Papa".
E o juiz Vaz Patto?
Toda a evidência sugere que ele é mais fiel à Igreja do que ao Estado - que é quem lhe paga -, mais fiel ao Papa do que ao Chefe de Estado, sob cuja autoridade suprema ele exerce a função de juiz no Tribunal da Relação do Porto.
O sexo é um tema central e recorrente nas intervenções públicas do juiz Vaz Patto - a prostituição, a castidade, a pornografia, os abusos sexuais.
Nos últimos anos, o Movimento dos Focolares foi assolado por uma série de escândalos sexuais. Tudo começou quando o próprio Movimento encomendou um relatório a uma consultora britânica sobre os abusos sexuais praticados ao longo de décadas por um alto dirigente do Movimento (Jean Michel Merlin, referido como JMM), muito próximo da fundadora, Chiara Lubich. O relatório sugeria que este não era um caso isolado, que existia uma cultura de abusos sexuais dentro do Movimento (cf. aqui e aqui).
De facto, um outro relatório divulgado pelos Focolares em Março de 2023 confirmava que o caso de JMM não era único (cf. aqui). Pela mesma altura discutia-se em Portugal o relatório da Comissão Independente sobre os abusos sexuais na Igreja, e o juiz Vaz Patto multiplicava-se em aparições na comunicação social em defesa dos padres e da Igreja.
Nesse frenesim comunicacional, que atingiu o auge em defesa do então cardeal patriarca, D. Manuel Clemente, acerca do qual circulavam notícias de que teria encoberto casos de pedofilia (cf. aqui), o juiz Vaz Patto faria algumas afirmações que deixariam perplexo qualquer observador atento.
Uma era a de que a a justiça eclesiástica - de que ele próprio faz parte, na qualidade de juiz do Tribunal Patriarcal de Lisboa - era mais rígida do que a justiça civil - de que ele também faz parte na qualidade de juiz do Tribunal da Relação do Porto - a lidar com os casos de pedofilia (cf. aqui), implicando que a pedofilia dentro da Igreja era assunto para ser tratado dentro da própria Igreja.
A outra, era de levar as mãos à cabeça. É a seguinte (ênfase meu)
"Ora, o responsável [juiz Vaz Patto] lembra que "o Código de Processo Penal é claro ao dizer que é obrigatória a denúncia deste e de outros crimes - crimes públicos, isto é, crimes que não dependam de queixa - apenas por parte das entidades policiais e por parte dos funcionários públicos, incluindo magistrados, em relação a factos de que tenham conhecimento no exercício das funções e por causa delas" (cf. aqui).
Quer dizer, enquanto membro do Movimento dos Focolares ou de dirigente da Igreja Católica, o juiz Vaz Patto não está obrigado a denunciar casos de pedofilia de que tenha conhecimento.
A dúvida legítima que imediatamente ocorre ao espírito é a seguinte:
-Será que o juiz Vaz Patto, em nome da sua lealdade à Igreja, conhece casos de pedofilia no seio do Movimento dos Focolares ou, mais geralmente, da própria Igreja, e não os reporta às autoridades civis?
Por outras palavras,
-Será que o juiz Vaz Patto encobre criminosos?
(Condenar inocentes, isso ele faz de certeza. Eu posso testemunhar: cf. aqui).
(Continua acolá)
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