13 janeiro 2024

Um passo de gigante (166)

 (Continuação daqui)



166. Uma justiça secreta


A procuradora Maria José Fernandes, acusada pelo Conselho de Disciplina do Ministério Público de violação dos deveres de lealdade, reserva e correcção em virtude de um artigo que escreveu para o jornal Público, pede que a sua defesa seja feita de forma pública (cf. aqui).

Não é nada certo que o seu pedido seja atendido, embora este seja um direito humano fundamental consagrado no artº 6º da CEDH que Portugal subscreveu - o direito que qualquer pessoa tem que a sua causa seja examinada publicamente (cf. aqui). 

(Ora, o Ministério Público quer lá saber de direitos humanos. Curiosamente, uma das denúncias mais contundentes que a procuradora Maria José Fernandes faz no seu artigo é a violação sistemática pelos seus colegas dos direitos humanos fundamentais dos arguidos)

Mas, então, a justiça que o Ministério Público faz, em relação aos seus membros, é uma justiça secreta?

Sim, é uma justiça secreta e já uma vez, num caso semelhante, envolvendo uma juíza e o Conselho Superior da Magistratura, Portugal foi condenado pelo Tribunal Europeu dos Direitos do Homem por praticar uma  justiça secreta (cf. aqui).

Outro aspecto que pode surpreender na acusação à procuradora Maria José Fernandes é a rapidez com que o Ministério Público produziu a acusação. O Ministério Público que, em relação aos cidadãos do país, demora anos a produzir acusações, foi extremamente rápido neste caso, demorou cerca de um mês. 

Finalmente, o carácter corporativo da "justiça" que se irá fazer à procuradora Maria José Fernandes. Foram os sete membros do Conselho Superior do Ministério Público (CSMP) designados pelo próprio Ministério Público que votaram a  favor do processo disciplinar. Houve três votos contra e uma abstenção, todos de membros do CSMP designados pela Assembleia da República. Conclusão: é a corporação que anda atrás da procuradora.

Uma justiça corporativa, rápida e secreta desencadeada por acusações de deslealdade de alguém que põe a boca no trombone denunciando os crimes cometidos rotineiramente pelos seus colegas. 

Faz lembrar alguma coisa?

Sim. Faz lembrar  a justiça da Máfia.  

(Continua acolá)

Sem comentários: