12 janeiro 2024

MENTIRAS




Qual é o lugar das mentiras no mundo?

 

Se um oficial das SS nos bate à porta à procura de uma família alegadamente escondida no sótão, o que devemos fazer?

 

Para o Benjamin Constant devemos mentir, porque “onde não direitos não há responsabilidades” e o nazi à porta não tem nenhum direito de atacar ou ferir ninguém e, portanto, ninguém tem a responsabilidade de lhe dizer a verdade.

 

Para Immanuel Kant devemos dizer a verdade, porque, caso contrário, ficamos automaticamente responsáveis por tudo o que de mau possa decorrer da mentira.

 

Sem pretender transformar um conto brejeiro (texto faz parte um conto) num debate filosófico, eu estou com o Benjamin e contra o Immanuel, mas estico mais a corda: mentir é uma ferramenta essencial para sobreviver numa sociedade que se afastou tanto da natureza humana que temos constantemente de esconder os nossos sentimentos e pensamentos. Se não mentir descaradamente, pelo menos ocultar a verdade é necessário.

 

No contexto conjugal, penso que mentir é fundamental para chegar, pelo menos, à bodas de prata e dar os filhos por criados.

 

Que benefício poderia advir de confessar à mulher, por exemplo, que a prima dela me beijou quando ficamos sozinhos no elevador ou, novamente por exemplo, ela confessar-me que o meu melhor amigo lhe atirou a cantada. Nenhum, porque são situações inconsequentes. Contudo, poderiam levar a distúrbios familiares e a corte de relações.

 

A cultura católica põe um grande ênfase na verdade e vai ao ponto de exigir confissões de pecados, mas logo a seguir perdoa com uns credos e umas ave-marias pelo meio. O objectivo será exercer poder sobre os fiéis?

 

As juras conjugais de dizer sempre a verdade aos parceiros, convenhamos, são a primeira grande mentira dos relacionamentos.

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