(Continuação daqui)
5. Um imposto sobre os capitais próprios
Quando Portugal foi socorrido pela Troika em 2011, não era só o Estado português que estava insolvente, era também a Banca. Dos 76 mil milhões de euros emprestados pela Troika a Portugal, 12 mil milhões foram destinados especificamente à recapitalização da Banca.
Terminava assim, com elevadíssimos custos para os portugueses, um ciclo particularmente promíscuo da relação entre o Estado e a Banca e Portugal. A Banca tinha financiado até à exaustão os défices excessivos dos governos de José Sócrates, e agora não tinha mais dinheiro para financiar o Estado. E o Estado, esse, tinha ainda menos dinheiro para acudir à Banca. Sucumbiram os dois entrelaçados um no outro.
As crises podem ser momentos de aprendizagem, corrigindo para o futuro aquilo que correu mal no passado. E, se é certo que houve algumas lições que foram aprendidas e implementadas com a crise financeira iniciada em 2008, houve outras que ficaram por considerar. Foi uma destas que em 2014 viria a provocar o clímax da crise financeira em Portugal com a falência do BES.
Refiro-me à institucionalização em bases económicas, racionais e transparentes da função seguradora que o Estado desempenha desde há séculos em relação à Banca. Foi esta função que levou à invenção dos bancos centrais - através dos quais o Estado acorria aos bancos em dificuldades -, o primeiro dos quais foi o Banco de Inglaterra, fundado em 1694, e que serviu de modelo a todos os outros.
Todas as seguradoras cobram um preço pelo serviço que prestam - e os bancos que frequentemente detêm empresas seguradoras e vendem seguros aos seus balcões -, sabem isso melhor do que ninguém. Esse preço chama-se "prémio" e corresponde geralmente a uma percentagem do valor do bem seguro, variando essa percentagem em função do risco associado à perda total ou parcial desse bem.
O seguro prestado pelo Estado aos bancos é contra a sua insolvência, isto é, contra a perda total ou parcial dos seus capitais próprios, que são propriedade dos seus accionistas. Segue-se que um imposto correspondente ao "prémio" do seguro prestado pelo Estado deve incidir sobre os capitais próprios da Banca (actualmente, cerca de 40 mil milhões de euros).
A taxa deste imposto deve ser suficientemente moderada para não desencorajar os bancos de acrescentarem aos seus capitais próprios, os quais são a primeira e principal linha de defesa contra a sua própria insolvência. Na minha opinião, poderia justificar-se uma taxa de 0,5% a 1%, a qual nas condições actuais daria ao Estado uma receita anual entre 200 e 400 milhões de euros.
Se esta relação existisse, e fosse assim transparente, tinha-se evitado, não apenas aquele que foi o clímax da crise financeira em Portugal, mas também, na minha opinião, o maior erro de política económica cometido por um governo democrático nos últimos 50 anos - a falência do BES.
Até um estudante do primeiro ano de Economia é suposto saber que o Estado não pode deixar ir à falência um banco daquela dimensão, com cerca de 20% do mercado. Se a relação seguradora estivesse institucionalizada, fosse transparente, e os "prémios" em dia, o Estado teria sido obrigado a cumprir a sua parte do contrato, injectando o dinheiro necessário para salvar o banco da falência.
Assim, por aquilo que terá sido uma "birra" entre os ministros das Finanças da altura (Vítor Gaspar e depois Maria Luís Albuquerque) e o banqueiro Ricardo Salgado, o Governo deixou cair o Banco. Ainda hoje os portugueses estão a pagar por isso.
(Continua acolá)
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