(Continuação daqui)
6. O meu modesto contributo
Recebi hoje um Aviso do Tribunal Constitucional para lhe pagar 4 794 euros em taxas de justiça no prazo de 15 dias, um pagamento que irei efectuar ainda esta semana.
Este montante refere-se a taxas de justiça relativas a uma decisão sumária (714 euros) e a dois acórdãos (2040 euros cada um) que foram proferidos no âmbito do meu case-study.
O Aviso especifica que estas taxas de justiça são "Receitas próprias" do Tribunal Constitucional, isto é, não são receitas do Estado nem dão entrada no Orçamento Geral do Estado, mas são receitas de que o Tribunal Constitucional pode dispor livremente.
Deixarei para depois mostrar onde é que o Tribunal Constitucional gasta o dinheiro que recebe a título de "Receitas próprias", para esclarecer primeiro os altos serviços constitucionais que o Tribunal Constitucional me prestou em troca do pagamento que agora lhe vou fazer.
O primeiro foi negar-me um direito constitucional - o direito ao recurso que está previsto no artº 32º da Constituição.
A história conta-se em poucas palavras. Eu tinha sido absolvido do crime de difamação agravada ao eurodeputado Paulo Rangel em primeira instância, mas fui condenado na Relação do Porto (cf. aqui). A Constituição diz no artº 32º que eu tenho o direito ao recurso (que seria para o Supremo Tribunal de Justiça) desta decisão, visando assegurar aquilo que na gíria jurídica se chama a "dupla conforme" - isto é, que ninguém será condenado sem que a condenação seja confirmada por um tribunal superior, evitando-se assim condenações arbitrárias ou corruptas (como era o caso).
Os dois juízes que me condenaram na Relação do Porto ignoraram ostensivamente a jurisprudência do TEDH e estavam em manifesta situação de conflito de interesses que tingia decisivamente a sua imparcialidade. Quer dizer, terão sido escolhidos a dedo, como agora se sabe ser prática normal nos tribunais portugueses.
O juiz Pedro Vaz Patto é colega do Paulo Rangel na Associação "O Ninho" (cf. aqui) e companheiro de causas políticas do eurodeputado do PSD. O juiz Francisco Marcolino, militante do PS, é bem capaz de ser o campeão em Portugal dos processos por difamação e, portanto, não pode seguir a jurisprudência do TEDH sob pena de esvaziar os próprios processos à custa dos quais tem enriquecido (cf. aqui). Ele só mudou a sua atitude recentemente - invocando a jurisprudência do TEDH - quando foi alvo, ele próprio, de um processo por difamação (cf. aqui) e, mesmo aí, só depois de acusar a própria mulher de ter proferido as ofensas à sua colega Paula Carvalho e Sá (cf. aqui).
Pelo serviço de me negar o direito constitucional ao recurso (para o Supremo) desta decisão do TRP eu vou pagar ao Tribunal Constitucional 714 euros por uma Decisão Sumária da "juíza" Rangel de Mesquita e mais 2040 euros pelo Acórdão 646/2020 de que também é relatora a "juíza" Rangel (cf. aqui).
Sempre parecerá estranho que um processo em que de um lado estou eu e do outro está o eurodeputado Rangel do PSD, e que teve origem numa crítica televisiva veemente ao PSD, tenha ido parar às mãos de uma "juíza" que também tem o apelido Rangel e que foi nomeada para o Tribunal Constitucional pelo PSD.
Dez meses antes do Acórdão 646/2020 de 16 de Novembro que me negou o direito ao recurso, o Tribunal Constitucional tinha reconhecido esse direito no Acórdão 31/2020 de 16 de Janeiro (cf. aqui) a quatro cidadãos portugueses que se encontravam rigorosamente na mesma situação que eu [quatro guardas da GNR num litígio com o juiz Neto de Moura].
Eu dirigi então um novo requerimento ao Tribunal Constitucional a pedir para ser tratado como os guardas da GNR. A resposta veio no Acórdão 229/2021 de 21 de Abril (cf. aqui) que reiterava a decisão de não me reconhecer o direito ao recurso e me negava o direito a ser tratado como os guardas da GNR.
Portanto, pelo serviço de me discriminar, que a Constituição proíbe, eu vou pagar ao Tribunal Constitucional mais 2040 euros que é quanto o Tribunal Constitucional me facturou por este Acórdão.
No total são 4 794 euros que, quando o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem me der razão, me serão devolvidos pelo Estado português. Nesse dia, a devolução será feita, não a partir das "Receitas próprias" do Tribunal Constitucional, que pode desde já gastar livremente o dinheiro que agora lhe vou pagar, mas a partir do Orçamento Geral do Estado, isto é, dos bolsos dos contribuintes portugueses.
Quer dizer, nesse dia serão os contribuintes a substituir-se a mim para financiar as "despesas livres ou discricionárias" dos juízes do Tribunal Constitucional, despesas que não estão sujeitas às regras e ao escrutínio do Orçamento do Estado porque provêm de "Receitas próprias".
A questão é portanto, a de saber onde é que os juízes do Tribunal Constitucional gastam livremente estas "Receitas próprias" como os 4 794 euros que eu agora lhes vou pagar.
Está sentado?
Eu desvendo já uma ponta do mistério. Quem me fez chegar o Aviso do Tribunal Constitucional, fê-lo acompanhar de uma simpática mensagem de conforto que dizia assim:
"Pagar, mandar-me prova, pois em princípio o Estado vai pagar isso.
"Agora é o seu modesto contributo para pagar os carros de alta cilindrada estrangeiros do TC.
Ass."
(Continua)
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