06 junho 2021

Case-study: actualização (5)

 (Continuação daqui)



5. Don Emílio Cuatrecasas

Um mês antes de eu ter afirmado, aos écrans do Porto Canal (cf. aqui), que um documento produzido pela sociedade de advogados Cuatrecasas era uma "palhaçada jurídica" - por cuja ofensa tive esta semana de a indemnizar em 5850 euros (cf. aqui), - o presidente da sociedade conseguia substituir por uma pena de multa (4 milhões de euros) uma sentença judicial que o condenara a dois anos de prisão (cf. aqui).

Ao contrário daquilo que geralmente se pensa, as grandes sociedades de advogados não derivam a maior parte das suas receitas por andarem a litigar em tribunal. Uma das principais fontes de receita é aquilo a que elas chamam "Fiscal" e que consiste em arranjar esquemas de fuga ao fisco aos seus clientes mais abastados, não raro metendo-os em trabalhos (como sucedeu ao Ronaldo e ao Messi), enquanto elas se põem ao largo.

Emílio Cuatrecasas dirigia a sociedade de advogados Cuatrecasas desde os anos 80, sucedendo ao pai Emílio, e ao avô, Pedro Cuatrecasas, o fundador. A sociedade é a segunda maior de Espanha e da Europa continental, factura cerca de 300 milhões de euros ao ano, tem a sua sede em Barcelona e está presente em vários países, sendo Portugal o principal, a seguir a Espanha.

Como é habitual nas grandes sociedades de advogados, a Cuatrecasas tem um pé na política e outro na advocacia - uma promiscuidade que é uma das principais fontes de corrupção da justiça -, sendo conhecidas as suas ligações ao PP em Espanha e ao PSD em Portugal. 

Para persuadir os clientes mais ricos a fugirem ao fisco e entregarem-se nas mãos da Cuatrecasas pagando os altos honorários que a sociedade cobra pelos esquemas que arranja, convinha que o presidente desse o exemplo, e ele próprio tivesse a sua fiscalidade construída segundo um elaborado esquema de fuga aos impostos.

Só que o esquema  de Don Emílio redundou numa verdadeira "palhaçada fiscal". Don Emílio foi apanhado pelo fisco espanhol. E a suprema ironia é que, quem o denunciou, foi a sua própria mulher.

Mercedes Cuatrecasas descobriu que o marido andava envolvido com uma advogada dos escritórios da Cuatrecasas em Madrid. Para uma catalã de gema, como ela, o envolvimento do marido com uma madrilena não era mera traição conjugal. Era alta traição! Diz-se que no momento de maior exaltação terá exclamado acerca da amante do marido "Aún se fuera una gallega!..." (cf. aqui)

Emílio Cuatrecasas foi condenado a dois anos de prisão por fuga ao fisco e, não fosse a ligação da sociedade ao Partido Popular, que estava no poder, teria ido mesmo para a cadeia. Aparentemente, movendo influências junto da vice-presidente do PP, Soraya Sáenz de Santamaria, Don Emílio conseguiu que a pena de prisão fosse comutada em multa (cf. aqui). Quando Soraya saiu do governo, a Cuatrecasas, reconhecida, ofereceu-lhe sociedade e um ordenado milionário (cf. aqui).

Don Emílio teve de resignar à sua condição de presidente da Cuatrecasas e diz-se que o divórcio de Mercedes lhe custou os olhos da cara. A tal ponto que só agora, quando a Cuatrecasas recebeu os 4422  euros líquidos que lhe paguei a semana passada (cf. aqui), Don Emílio pôde ir, finalmente, passar um fim de semana prolongado a Lloret del Mar com a sua namorada madrilena.

Um fim de semana de luxo para Don Emílio y su nuevo amor à custa dos contribuintes portugueses.

E esta, hein..?

(Continua)

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