Num post anterior procurei ilustrar como, após dois séculos de negação, a Igreja Católica finalmente reconheceu oficialmente na Encíclica Centesimus Annus (1991) que o liberalismo é a solução para tirar, em massa, o homem da miséria.
É certo que, passados quase 30 anos, esse reconhecimento ainda não chegou a Lisboa à sede da Conferência Episcopal Portuguesa e à sua voz laica, a Comissão Nacional Justiça e Paz. Mas, acreditando que um dia vai chegar, eu vou prosseguir respondendo à questão:
-Como é que o liberalismo liberta os povos da pobreza? De que é que se faz, e de que elementos se compõe, essa tecnologia social que, por onde passa, tritura em massa a pobreza?
O primeiro passo é o de acabar com a sacralização da pobreza e dos pobres.
Adam Smith, o primeiro economista liberal, que deu origem ao nascimento da moderna Ciência Económica, era um presbiteriano praticante, um ramo do calvinismo na altura muito prevalecente na Escócia.
Com referi noutro lugar (cf. aqui) a doutrina da justificação calvinista não atribui qualquer importância às obras (de caridade) para obter a salvação. O homem justifica-se perante Deus apenas pela fé.
Pelo contrário, na teologia católica um homem pode justificar-se não somente pela fé, mas também pelas obras. Não apenas os pobres são os filhos mais queridos de Deus, e a Igreja tem por eles uma opção preferencial, como são eles que podem permitir a salvação dos ricos. Os ricos podem redimir-se dos seus pecados através das obras de caridade, assim conquistando a vida eterna.
O liberalismo retira os pobres do pedestal em que o catolicismo os coloca e olha para eles como olha para quaisquer outros filhos de Deus, e certamente sem o carinho peculiar que nos países católicos invariavelmente confere aos pobres o estatuto de coitadinhos.
Não se trata de virar as costas aos pobres. Trata-se, por parte do liberalismo, de não lhes dar nenhum estatuto especial, nem aos pobres nem à pobreza, e concentrar-se naquilo que interessa para tirar os pobres da pobreza - que é a criação de riqueza.
O livro de Adam Smith, o primeiro tratado de liberalismo económico, põe o ênfase na riqueza, não na pobreza. Está no título: "A Riqueza das Nações" (cf. aqui).
Mais de duzentos anos depois, a caminho de trezentos, quem visitar a página da Comissão Nacional Justiça e Paz (cf. aqui), a voz laica da Conferência Episcopal Portuguesa, encontra vários artigos a bendizer os pobres e a pobreza - nenhum sobre os ricos e a riqueza.
Excepto um, que tem o título "Ética e criminalidade económica e financeira" em que se faz referência a profissionais do sector financeiro e até a banqueiros, que frequentemente são tomados por ricos. Mas aí é para os criminalizar e lançar as culpas sobre eles.
Sem comentários:
Enviar um comentário