01 outubro 2018

O Grande Mistério (VI)

(Continuação daqui)

VI. Alguma coisa



O que é que aconteceu, afinal, entre a quarta e a quinta sessões do meu julgamento, no mês que decorreu entre 4 de Abril e 4 de Maio, para criar vários mistérios e, entre eles, o Grande Mistério:

Por que é que o magistrado X não compareceu à 5ª sessão do meu julgamento?

Foram três acontecimentos que ocorreram no espaço de menos de uma semana, entre 4 e 10 de Abril, e que lançaram o pandemónio nas hostes da acusação.

O primeiro teve lugar na própria sessão de 4 de Abril e foi o interrogatório do magistrado X ao director da Cuatrecasas-Porto, Filipe Avides Moreira.

Pôs a claro o conluio que existiu entre a administração do HSJ e a Cuatrecasas para, através do documento produzido por esta, boicotar a obra do Joãozinho.

No Portugal Contemporâneo, logo a partir do dia seguinte, eu descrevi os aspectos mais salientes do interrogatório e ampliei os seus efeitos, avisando o Avides Moreira que se preparasse porque na próxima sessão iria receber o golpe fatal. O meu optimismo era transbordante e resultava da convicção de que ele iria ser constituído arguido pelo magistrado X juntamente com alguns dos seus colegas da Cuatrecasas e os administradores do HSJ.

O segundo veio cinco dias depois e foi este artigo do JN (cf. aqui). O meu julgamento vinha finalmente a público. Era um artigo de página inteira encimado pela fotografia do Paulo Rangel e da minha, na secção "Justiça".

Eu não conhecia o jornalista que o elaborou e não tive qualquer interferência no artigo. Mas o jornalista é que conhecia de certeza o Portugal Contemporâneo porque a peça de informação que era central ao artigo e que lhe conferia todo o interesse, ele só  a poderia ter vindo buscar a este blogue (cf. aqui) porque eu não a divulguei em mais lado nenhum. Era aquela peça de informação que se referia aos 5 mil euros.

O artigo era devastador nas interrogações que deixava no ar. Então, uma grande sociedade de advogados, chefiada por um político, exige 100 mil euros de indemnização e depois, à boca pequena, fica-se por 5 mil? É para isto que existem os advogados? E o Estado, através do Ministério Público, patrocina uma coisa destas? É para isto que serve a Justiça? E a sociedade de advogados, ainda por cima, é aquela que o réu acusa de ter parado a obra do Joãozinho deixando as crianças lá enfiadas naqueles barracões?

O terceiro veio no dia seguinte, 10 de Abril, ainda através do JN (cf. aqui). Jorge Pires, o pai de uma criança em tratamento oncológico veio lançar o escândalo público - o qual perdura até hoje - acerca das condições em que as crianças são tratadas no HSJ.


A direcção nacional da Cuatrecasas em Portugal está em Lisboa, e a sede multinacional da empresa está em Barcelona. Qualquer alto responsável da Cuatrecasas em qualquer destas cidades ficaria preocupado com o que se estava a passar envolvendo o escritório da sociedade no Porto.

A direcção regional do Ministério Público, à qual pertence Matosinhos, está no Porto e a direcção nacional, que tem no vértice a Procuradora Geral da República, está em Lisboa. Qualquer alto responsável do Ministério Público em qualquer destas cidades, ficaria igualmente preocupado com o que se estava a passar no tribunal de Matosinhos.

Qualquer jornalista que juntasse estes três acontecimentos iria chegar às seguintes conclusões:

1. A Cuatrecasas em conluio com a administração do HSJ tinha boicotado a obra do Joãozinho. O episódio que estava em julgamento acabaria por ser ultrapassado. Meses depois, porém, os mesmos intervenientes tinham feito nova tentativa, e desta vez obtiveram sucesso - a obra estava parada há dois anos.

2. O Governo era cúmplice deste boicote.

3. A Cuatrecasas, e o seu director, tendo como testemunhas os seus próprios cúmplices - os administradores do HSJ - apresentaram uma  queixa-crime  contra o presidente da Associação Joãozinho por ofensas - uma queixa cuja credibilidade era aquela que o JN agora exibia - nenhuma. Recorriam a uma estratégia antiga, a de fazer o mal e a caramunha. Para esconder o mal que faziam decidiram acusar a vítima.

4. O Ministério Público, representando o Estado português, credibilizou tudo isto transformando a queixa num processo crime cujo julgamento estava agora a decorrer em Matosinhos, como o JN relatava.

5. Entretanto, a obra continuava parada e as crianças continuavam internadas no HSJ em condições sub-humanas, como um dos pais tinha vindo agora denunciar.

Um jornalista que pegasse neste assunto poderia criar a pressão mediática para construir o hospital de crianças. Nenhum pegou, mas não se sabia na altura se pegaria (ou se algum dia virá a pegar). O risco era enorme. Qualquer alto responsável da Cuatrecasas ou do Ministério Público estaria preocupado, e teria feito alguma coisa.

Não surpreende, por isso, que, em meados de Maio, depois de 5ª sessão do meu julgamento, eu que, um mês antes andava a prever com todo o optimismo a constituição da Cuatrecasas como arguida, já previsse agora era a minha própria condenação, nem que fosse numa pena leve (cf. aqui), como veio a acontecer.


(Continua)

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