01 outubro 2018

O Grande Mistério (V)

(Continuação daqui)

V. Um pequeno pormenor

Aquela era a sessão em que, desde há um mês, eu vinha anunciando neste blogue que a advogada de defesa desferiria o golpe fatal - na realidade, uma série de golpes fatais - no seu colega Avides Moreira, pondo-o à disposição do magistrado X para o constituir arguido, bem como aos seus colegas da Cuatrecasas  e aos administradores do HSJ.

Nesse dia, 4 de Maio, o feitiço iria voltar-se contra o feiticeiro.

Chegado o dia, porém, antes de entrar na sala de audiências eu já tinha percebido que a minha advogada não iria desferir golpe fatal algum no seu colega Avides Moreira. E quando entrei na sala de audiências, a minha decepção duplicou. Nem sequer o magistrado X lá estava.

Pelo contrário, a partir desse dia o ambiente na sala de audiências virou-se de novo contra mim e a minha condenação começou a pairar no horizonte. No blogue eu protestei pela falta de comparência do magistrado X e exigi o seu regresso (cf. aqui). Não sabendo o seu nome, foi nessa altura que lhe fiz o baptismo (cf. aqui). E, na incerteza de o voltar a ver, despedi-me dele, não sem lhe fazer saber que ele tinha sido até ali o meu herói (cf. aqui).

O magistrado X acabaria por regressar na sessão seguinte, mas vinha muito diferente. Parecia indiferente ao julgamento e as testemunhas que estavam por inquirir eram sobretudo testemunhas abonatórias. Poderia ter tirado tudo o que quisesse da única testemunha de defesa, mas o interrogatório foi morno e quase indiferente.

No dia a seguir, consagrado às alegações finais, o magistrado X fez tudo sem convicção. Esqueceu-se das notas no gabinete, fez um discurso embrulhado acerca do respeito que é devido aos políticos e aos advogados e no fim, com o ar rotineiro que é próprio de um burocrata de acusação, pediu a minha condenação.

Eu viria a ser absolvido do crime de difamação agravada ao Paulo Rangel onde o magistrado X servira de acusador público durante todo o julgamento. O magistrado X deve ter ficado conformado, e os seus superiores hierárquicos devem ter respirado de alívio. O Ministério Público não recorreu da sentença. Para o Ministério Público o processo terminava aqui.

Durante todo o mês anterior, nas minhas previsões e no meu optimismo, eu tinha-me esquecido de um pequeno pormenor. O magistrado X faz parte de uma estrutura burocrática e hierarquizada. Ele não faz em tribunal aquilo que quer, mas aquilo que os seus superiores hierárquicos lhe mandam fazer.

Ele não estava ali para descobrir acusadores criminosos e réus inocentes. Ele não estava ali para fazer justiça. Ele estava ali para acusar o réu, pondo-se ao lado dos acusadores. Ora o magistrado X, em todo o seu trabalho e ainda que não o pretendesse,  tinha vindo a fazer exactamente o contrário, acusando os acusadores e inocentando o réu.

Começava a desvendar-se o Grande Mistério:

-Por que é que o magistrado X não compareceu à 5ª sessão do meu julgamento?

Mas restava ainda uma pergunta: O que é que motivou tudo isto, que pandemónio se terá vivido, onde e por quem, para produzir esta dupla coincidência:  no mesmo dia em que a advogada de defesa renunciava a ferir de morte o seu colega Avides Moreira, o magistrado X, que o devia constituir arguido, não ter comparecido ao julgamento?


(Continua)

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