24 janeiro 2017

O Mundo às Avessas

Gradualmente, e com o decorrer do tempo, fui-me habituando à ideia de que tudo o que a Igreja diz, embora por vezes seja formulado em termos abstractos, tem correspondência na realidade. Eu gosto do catolicismo porque ele é verdadeiro - aquilo que diz adere à realidade. Aquilo de que eu às vezes não gosto é da realidade. Mas isso não é culpa do catolicismo - é da realidade -, e não pode ser razão para  criticar o catolicismo. É como querer matar o mensageiro, não se gostando da mensagem.

Chesterton, que veio do anglicanismo para se converter ao catolicismo, teve o mesmo sentimento muito antes de mim, pelo que o meu não é nada original, e deve ser partilhado por muitas outras pessoas que chegaram ao catolicismo não pelo coração - que é a melhor forma e a mais genuína de lá chegar, produzindo os melhores católicos -, mas pela via do intelecto, que é claramente um second best. Escreveu Chesterton:  "A minha dificuldade em explicar por que sou católico resulta de existirem cerca de dez mil razões, mas todas se resumem numa só: Porque o catolicismo é verdadeiro".

Chesterton escreveu alguns dos seus melhores textos entre 1922, data da sua conversão, e 1935, data da sua morte, um período de grande crise política e económica no Ocidente e que prenunciou a Segunda Guerra Mundial - um período também com muitas semelhanças com o presente. Diz ele "O que se perdeu nesta sociedade não é tanto a religião como a razão, a luz natural do instinto intelectual que guiou os filhos dos homens".

A razão apresentada como a luz que guia os filhos...Aquilo que Chesterton quer significar é que se perdeu o Logos, a Razão criadora, ficando em seu lugar apenas a razão (iluminista, kantiana) que se resume a meras razões. O resultado desta perda é talvez o título de um dos seus ensaios mais famosos, escrito em 1929: "O Mundo às Avessas".

Antes de procurar estabelecer a diferença entre o Logos e a mera razão (iluminista), e lançar alguma luz sobre o tema de Chesterton - a perda resultante de se passar de uma a outra - aquilo que pretendo salientar neste post é que o Logos - a Razão criadora - não é uma ideia abstracta de filósofos e teólogos. Tem realidade concreta, em primeiro lugar nas pessoas do pai e da mãe, mas também de outras autoridades naturais, como o padre, o professor ou o juiz. E pode também encontrar-se em todos os outros criadores, como o jardineiro, o poeta ou o empresário.

8 comentários:

Euro2cent disse...

> O que se perdeu

E porque é que se perdeu?

Tenho um palpite ("quelle surprise", já sei ;-), mas não digo hoje.

Pedro Q. disse...

Que livros de Chesterton recomenda?

Anónimo disse...

@Anónimo
Quando é de madrugada, o sono não chega, e a única maneira de adormecer é verborrear-se em blogs. XD

Ricciardi disse...

É provável é natural que o caro PA desconheça outras religiões e que oriente os seus argumentos para aquela que conheça e na qual foi educado. Isso acontece consigo, comigo e com pessoal doutros quadrantes religiosos.
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Se experimentar elevar o espírito para lá das nuvens, verá que existem pessoas ilustríssimas doutras religiões que argumentam da mesma forma. A razão e o intelecto não são exclusivo do pessoal católico.
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Eu ainda não percebi como se chega ao catolicismo através do intelecto. Ou se crê nos dogmas ou não se crê. O intelecto não é chamado para este assunto.
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O que podemos dizer é que o catolicismo tornou-se numa religião temperada e defende valores com os quais estamos de acordo.
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Rb

Ricciardi disse...

O credo católico é um bom exemplo. Ou se crê ou não se crê. Não há intelecto algum nisto.
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"Creio em um só Deus Pai todo-poderoso..."
"Creio em um só Senhor, Jesus Cristo, Filho Unigênito de Deus, nascido do Pai antes de todos os séculos.."
"Creio no Espírito Santo, Senhor que dá a vida, e procede do Pai e do Filho"
"Creio na Igreja, una, santa, católica e apóstolica"
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Ou crê ou não crê. Se não crê ou tem duvidas não é católico.
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Eu não creio nem deixo de crer. A única certeza que tenho é que a Palavra de Cristo me serve de farol.
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Rb

Monte Zephyrus disse...

O meu grande problema com a Igreja Catolica portuguesa esta na relacao que tem com a pobreza e o dinheiro. O proprio Professor ja escreveu um texto sobre a pobreza que viu na Argentina, um pais catolico.

Monte Zephyrus disse...

De notar que no meu comentario referi Igreja portuguesa.

E que ha diferencas primeiro entre a igreja portuguesa e a espanhola. E depois entre a igreja iberica e a italiana, alema ou francesa.

Para percebermos o que se passou teremos de recuar cerca de 500 anos. Em Portugal havia varias ordens e a Igreja era de certo modo heterogenea.

Segundo o prof. Saraiva, a Inquisicao criou milhares de judeus e criou um clima de condenacao do lucro e da livre iniciativa. A Inquisicao era controlada pelos Dominicanos, a os Dominicanos opunham-se os Jesuitas.

A Inquisicao portuguesa foi singular e diferente por se ter centralizado na perseguicao aos judeus e cristaos-novos. Portanto perseguia na realidade os medicos, mercadores, colectores de impostos, astronomos, matematicos. As gentes do saber e do dinheiro.

Penso que e neste episodio que esta a raiz do nosso odio aos ricos e dos nossos problemas com o dinheiro.

Recordo que a Austria, Franca, Norte de Italia, Catalunha, Sul da Alemanha ou Belgica sao regioes historicamente catolicas e sempre foram ricas.

Anónimo disse...

O dr. Arroja é um grande filho da puta.