27 outubro 2020

NÃO HÁ MAIOR TRAGÉDIA DO QUE ESTA

Há momentos em que somos chamados a contribuir para a solução de problemas que, pela sua dimensão, constituem tragédias nacionais e em que temos de superar preferências pessoais e até fanatismos ideológicos para servir o BEM COMUM.

 

Foi isso que fez o atual bastonário da Ordem do Médicos, o Dr. Miguel Guimarães, e cinco ex-bastonários, quando dirigiram uma Carta Aberta à Ministra da Saúde a expor a verdadeira tragédia que afeta o SNS e que traduziram em números:

 

Os números dispensam adjetivos: neste período covid-19, houve 100 mil cirurgias atrasadas no SNS, a que se junta um milhão de consultas nos hospitais, milhares de rastreios que ficaram por fazer, designadamente em oncologia, 17 milhões de meios e exames de diagnóstico e terapêutica, cinco milhões de consultas presenciais nos cuidados de saúde primários. O número de óbitos não-covid disparou, com mais 7144 mortes entre março e setembro do que a média dos mesmos meses dos últimos cinco anos. Desde AVC que não foram tratados em tempo útil, passando pelo agravamento de doenças como a diabetes ou situações oncológicas, como é sabido, as consequências vão, infelizmente, tornar-se mais esmagadoras a médio prazo. O não diagnóstico atempado e o não-tratamento prolongado, como está a acontecer, reduzem a esperança e a qualidade de vida dos doentes — doentes que, em muitos casos, desconhecem até que o estão. Os graves problemas do SNS pré-covid já exigiam um plano de ação musculado e continuado, que tardava em chegar; o contexto atual tornou-se ainda mais complexo e exigente, retardando de forma brutal o combate e o tratamento das mais diferentes patologias.

 

Nessa carta, os signatários apelam a soluções imediatas e inclusivas, que defendam a vida dos portugueses que têm visto sonegado o seu direito constitucional de acesso à saúde:

 

Não há tragédia maior do que esta. É preciso mudar já. É preciso um investimento de grande envergadura que reforce fortemente o SNS. Mas, no imediato, não basta. Os doentes precisam de uma resposta agora, pelo que não podemos prescindir de uma visão de conjunto. Os sectores de saúde sociais e privados podem ser mais envolvidos no esforço covid e não-covid para que a capacidade instalada seja efetivamente usada em vez de desperdiçada.

 

Eu subscrevo inteiramente estas declarações e louvo a iniciativa corajosa dos bastonários.

 

Não me revejo, porém, no texto que alguns distintos colegas publicaram na edição do Público de hoje (27/10/2020) e onde acusam os bastonários de “desrespeito pelas verdadeiras tragédias”, alarmismo e influência (também chamada “lobby”, não é?) a favor do sector social e privado da saúde e contra o SNS.

 

Estas acusações subestimam os milhares de mortos não-COVID, o sofrimento das respetivas famílias e a abnegação dos Portugueses, demonstrada na guerra ao COVID19. É também muito questionável o processo de intenções subjacente às acusações dirigidas aos bastonários e a focalização ideológica subjacente.

 

A CRISE AFETA TODOS OS PORTUGUESES E TODOS DEVEM SER CHAMADOS A SUPERÁ-LA, sem quaisquer preconceitos políticos.

 

Os signatários do referido texto afirmam que A Ordem dos Médicos é uma entidade de direito público, de inscrição obrigatória. Portanto, as posições expressas pelos seus órgãos eleitos têm que corresponder ao máximo denominador comum.

 

Discordo, a Ordem dos Médicos é de facto uma instituição de direito público, mas tem líderes e, em momentos de grave crise nacional, esses líderes têm de ver mais longe e propor soluções que respeitem o supremo interesse dos nossos concidadãos, independentemente de refletirem ou não o “máximo denominador comum”, o que quer que isso seja. A Ordem tem de ser uma instituição de princípios.

 

Já fui difamado e vilipendiado por colocar a ciência e a “legis artis” acima dos populismos alarmistas e mascarados, mas mantive-me firme nas minhas convicções.

 

O Sr. Bastonário, Dr. Miguel Guimarães, deve fazer o mesmo. Manter a linha traçada na sua Carta Aberta à Ministra da Saúde e ouvir todas as opiniões, mesmo que contrárias, sem sucumbir ao populismo do “máximo denominador comum”.

 

A verdade pode não ser democrática, mas é a verdade, e é verdade que “NÃO HÁ MAIOR TRAGÉDIA DO QUE A QUE ESTAMOS A VIVER”.

Sem comentários: