29 março 2020

Cristina Ferreira

Um excelente trabalho da jornalista Cristina Ferreira hoje no Público sobre as sociedades de advogados (cf. aqui).

A Cuatrecasas ocupa quase uma página inteira, vá-se lá saber porquê. (Aparentemente, anda por lá um pandemónio).

Um dos temas centrais do trabalho é, evidentemente, a opacidade das sociedades de advogados que, ao contrário de qualquer outra sociedade, não são obrigadas a reportar publicamente as suas contas e o seu relatório de actividades.

As razões que são dadas por vários dos advogados entrevistados para esta opacidade fariam corar de vergonha qualquer menino de escola.

A verdadeira razão é que a maior parte dos deputados na Assembleia da República também são advogados e fazem leis com privilégios especiais para si próprios e a sua profissão. As leis que se aplicam aos outros - como as da transparência e do escrutínio público - não se aplicam a eles.

Não é de mais insistir que os principais focos de corrupção na justiça e no país estão precisamente naquelas duas grandes corporações de juristas cuja actividade é opaca e não está sujeita a escrutínio público - as grandes sociedades de advogados e o Ministério Público.

A relação entre sociedades de advogados e o Ministério Público é brevemente aflorada pela jornalista quando escreve: "No quadro do julgamento da chamada Operação Fizz [cf. aqui], o ex-procurador Orlando Figueira, condenado a seis anos de prisão, acusou de vários crimes, um deles de perjúrio, Daniel Proença de Carvalho, advogado de Manuel Vicente, ex-vice- presidente do BCP e ex-vice-presidente de Angola. E o Ministério Público mandou recentemente investigar o causídico, que se afastou dos holofotes mediáticos".

Quer dizer, deduz-se que quem corrompeu o magistrado do MP foi o advogado, que é presidente de uma das maiores sociedades de advogados do país - a Uría Menendez Proença de Carvalho.

É esta mesma tese de concubinato entre as grandes sociedades de advogados e o Ministério Público que eu desenvolvi naquele que é um dos posts mais partilhados deste blogue no último ano. Tem o título "Que amor é este?" (cf. aqui)

Fica a esperança de que o movimento recente de opinião no país sobre a Justiça - largamente liderado pelo jornal Público -, e que inclui o presente trabalho da Cristina Ferreira, venha a modificar este estado de coisas num horizonte visível.

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