16 dezembro 2017

herege

Depois de ver a entrevista da ex-presidente da Raríssimas à RTP e de ler a entrevista que ela deu ao Expresso, não encontro nada de materialmente relevante de que possa ser acusada.

Aquilo por que estou impressionado é com a obra que ela realizou e vai deixar a todos os portugueses, especialmente àqueles que têm filhos com doenças raras.

Houve um tempo em que o bem comum só podia ser prosseguido através dos padres da Igreja. Hoje, ele só pode ser prosseguido através dos novos clérigos - políticos e burocratas, aqueles que tenho vindo a designar sumariamente por aristocracia.

Neste sentido, ela é uma quase-perfeita herege. Daí a indignação pública.

(Embora a Raríssimas tenha recebido subsídios do Estado para construir a Casa dos Marcos, os montantes que actualmente recebe do Ministério da Saúde e do Ministério da Segurança Social são pagamentos por serviços prestados ao SNS e a pessoas carenciadas ao abrigo de protocolos).

Eu estava particularmente interessado em vê-la na entrevista que deu à RTP - que foi gravada Terça-feira, no auge da indignação popular - para avaliar o seu estado de espírito.

Pareceu-me bem e não fiquei surpreendido. É que uma pessoa que é alvo de uma campanha pública como ela - e que, para quem assiste, dá a ideia de não poder sair à rua sem pôr em risco a sua própria vida - é logo aproximada por muitas pessoas que, em privado, lhe exprimem o seu apreço e a sua admiração.

Tenho alguma experiência na matéria. Daí a minha curiosidade. Confirmou-se. Os portugueses adoram hereges (e neste aspecto são perfeitamente cristãos, porque Cristo também o foi) mas só exprimem a sua admiração por eles em privado. Em público, exprimem
a posição oficial de condenação. Não vá o diabo tecê-las.


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