Vejo agora que tive direito a referência
de Pedro Arroja que me acusa, simpaticamente, de eu sobrevalorizar a ação dos
serviços públicos de Saúde no estado sanitário do País e sobretudo na mortalidade infantil que segundo ele, num
otimismo ingénuo, seria sempre baixa
existisse ou não SNS: ” as razões da
queda acentuada da taxa da mortalidade infantil nos últimos trinta anos em
Portugal são outras e têm muito pouco a ver, se é que têm alguma coisa a ver, com o SNS”, diz, arrojadamente,
Pedro Arroja.
Sem hesitação, sem estudo, com as certezas que lhe vêm dos tempos em que
tudo que era Estado o horrorizava, faz uma afirmação que mais não é que uma
opinião, em sintonia com o universal direito irresponsável à opinião sobre tudo
e sobre todos de cada um de nós na pobre democracia portuguesa.
Não há ninguém que minimamente estude a importância de Medicina moderna que
não saiba que a sua acção em mudar estatísticas gerais de saúde através da ação clínica dos cuidados
personalizados é mínima e que os seus benefícios
se refletem no tratar e curar o doente, sem que isso tenha uma nítida
influência na melhoria das taxas sanitárias globais.
Estas melhoram, como todos sabemos, com o sistema de esgotos, a água
tratada, a ação das ASAE no controlo dos mercados alimentares, a educação e comportamento dos cidadãos e a ação
educativa, pedagógica e orientadora da Sáude Pública, preocupação imperativa dos
Estados.
E enquanto a medicina personalizada cura e salva quem pode e apenas
muda o panorama cada vez mais extenso
das doenças tratáveis, acrescentando
anos à vida, é a medicina preventiva e a saúde pública que pela sua ação sobre
as doenças sociais ( tuberculose, SIDA, toxicodependências, epidemias, doenças
evitáveis, etc), vão conseguindo melhorar a saúde das populações e melhorar as
estatísticas sanitárias.
É o caso da mortalidade infantil que
Pedro Arroja considera estar a 2.5 por mil nascimentos, sem precisar do
SNS para nada.
Em 1972, altura em que se iniciou a grande estruturação do Ministério da Saúde
( Decretos Lei 314 e 414) a mortalidade
infanil ( mortalidade no primeiro ano de vida) era de 58 /mil!
Por isso a primeira grande campanha dos então criados Centros de Saúde da
Direção Geral da Saúde foi centrada na saúde materno infantil.
E a partir de então, porque a tradição tão querida de Pedro Arroja nada
ajudava, assentando na ignorância, na naturalidade da morte dos “anjinhos” , na
pobreza e na falta de higiene, a luta contra este “castigo” tornou-se
prioritária e constante.
Generalizou-se o programa de
vacinações obrigatórias, todos os
recém-nascidos foram despistados em relação ás doenças raras e mortíferas provocadas por “erros inatos de metabolismo”, (a célebre picada no pezinho), as gravidezes
foram sujeitas a vigilância programada e
a controlos periódicos ecográficos, a antiga formação das parteiras foi
substituída pelas enfermeiras especialistas com formação superior, de um terço
da partos assistidos por vizinhas e familiares em casas sem condições, passámos
a ter quase 100% realizados nos hospitais equipados em meios e em pessoal
especializado, fechando-se as salas de parto de hospitais sem condições e sem
movimento mínimo que garantisse experiência e capacidade de intervenção imediata
em situações imprevistas.
E uma rede de serviços de neonatologia, preparada para cuidados intensivos
a prematuros por profissionais de saúde especializados cobriu as necessidades
do País.
E de 58 bebés mortos em cada mil antes de atingirem um ano de vida, número da nossa
vergonha, só idêntico em países de terceiro mundo, passámos a 2,5 e cerca de
cinco mil crianças são roubadas anualmente á morte prematura.
Este programa que envolveu um grupo de médicos e enfermeiros que, por todo
o país, tiveram que desfazer hábitos, tradições e falsas certezas é um exemplo,
entre muitos, da importância da medicina preventiva na criação e manutenção de
uma sociedade saudável.
Se a clínica garante um direito individual à orientação na saúde e tratamento na doença é a prevenção e os
programas de saúde pública que monitorizam, vigiam e corrigem a saúde das populações.
Quando há dias dei a conhecer o artigo do Prof. Costa Almeida de Coimbra
sobre o sucedido como o seu doente inglês quis mostrar que em Portugal corre um
programa em pleno êxito sobre os AVC ( acidentes vasculares cerebrais), chamado
Via Verde do AVC que tem preparados os hospitais do Norte para tratarem estes
doentes nas primeiras horas do início dos sintomas: a chamada mediata do INEM, pelo 112, leva-o a contactar o centro
preparado mais próximo, a ir buscar o doente, enviar o ECG de forma a poder-se iniciar o tratamento imediatamente, em menos
de uma hora, à chegada do doente ao SU.
Foram já atendidos neste programa 2363 doentes, com muito bons resultados,
tendo sido feita a desobstrução da artéria
( trombólise) nos hospitais da Região Norte, a 765 doentes com AVC isquémico até 2009( números
confirmados).
Os serviços públicos de saúde para nada servem?
Será que mais não são que formas soviéticas de procedimentos burocráticos e
sem controlo?
Será que devem ser abandonados como programas de Estado e deixados à livre concorrência
das multinacionais?
Será que o que vale a pena é dar a todos a liberdade de se tratarem se
tiverem dinheiro ou seguro privado, por que a Comunidade tão coesa e catolicamente
endeusada não tem nem quer ter dinheiro para SNSs?
O SNS tem ou não que ser um imperativo ético e soberano,” o não matarás e
tratarás dos enfermos” do Portugal moderno, católico, laico, republicano ou
monárquico?
Onde está a Política?
Bolas!
15 comentários:
Muito bem. Parabens.
.
Rb
Eu esperava que o dr. Paulo Mendo refutasse o argumento apresentado pelo dr. Arroja, quando diz que a mortalidade infantil já vinha a cair desde o início dos anos 60. Certo que era um número alto em 1972, mas... já vinha a cair anteriormente, ou não? Se vinha, porquê?
ehehehe
Muito bem, pois.
Mas estou-me a rir porque a História repete-se.
1º o Blasfémias convida o PA e recebe o inimigo dentro de portas; agora o PC convida o Paulo Mendo e dão tiros nos próprios pés
AHHAHAHAHAHAHA
E eu, que estava a leste de quem se tratava, pensei logo que tinha sido coisa do Birgolino para ajudar a vender seguros
ahahahahahahahah
Caro Dr. Paulo Mendo,
Junto para sua informação e reflexão:
http://en.wikipedia.org/wiki/List_of_countries_by_infant_mortality_rate
Abraço
PA
Quanto a isso, sem dúvida.
O PM tem uma visão do Estado Novo demasiado preconceituosa, tendo em conta que o viveu em idade adulta.
É estranho mas o PREC e o que se seguiu fez demasiadas lavagens cerebrais.
Já não é a primeira vez que fala aqui num passado terceiro-mundista, referindo-se aos tempos de Caetano, que é absoluto disparate.
"a ação das ASAE"
A Asae surgiu muito recentemente, antes disso, qualquer organismo que lhe antecedeu não teve os meios, os poderes, a dinâmica que esta agência tem atualmente.
A melhora das condições higieno-sanitárias nos lugares onde há concentração de público já era visível muito antes de criarem esse organismo soviético, que mais atrapalha do que ajuda.
Sem desmerecer totalmente as explicações do Dr. Paulo Mendo, que muito gosto de ler, o tipo de análise expressa na citação da ASAE é a mesma que aplica nas descidas da mortalidade infantil.
O Prof. Arroja não desmerece os cuidados de saúde mas o SNS, que poderia ser outro "S" quaquer coisa sem ser estatal na atuação.
"mas... já vinha a cair anteriormente, ou não? Se vinha, porquê?"
Por causa dos antibióticos. E das vacinas.
Só que estes recursos não eram para a generalidade da população infantil.
Eu acho imensa piada a este ódio estalinista e completamente irracional ao SNS. Sobretudo vindo de quem mais tem beneficiado com ele.
Ponto.
O que me espanta no "pensamento" do Pa e do seu pequeno séquito é a completa irracionalidade da
da argumentação. Temo bem que o post articulado e com a sólida argumentação do dr Paulo Mendo não seja minimamente valorizado por estas hostes. Em boa verdade há um lado bastante "sectário" no modelo económico neoliberal que tem o seu quê de estalinismo puro e duro. O que conta é a sua ideologia e o seu private hate contra o SNS - que justificam depois elocubrações mais ou menos teóricas, mais ou menos absurdas e, em regra, bastante mal escritas. Desta forma
o debate inteligente torna-se quase impossível - há umaersão "clubística" e quase "mágica"
da realidade, onde as estatísticas , as evidências
científicas ou a argumentação racional esbarram contra uma "mantra" de crenças estereotipadas.
è mais fácil debater com um fundamentalista islâmico que com um fundamentalista neocon.
"Será que o que vale a pena é dar a todos a liberdade de se tratarem se tiverem dinheiro ou seguro privado, por que a Comunidade tão coesa e catolicamente endeusada não tem nem quer ter dinheiro para SNSs?"
muito bem
reescreveria contudo a frase assim
"Será que o que vale a pena é dar a todos a liberdade de se tratarem se tiverem dinheiro ou seguro privado, por que a Comunidade tão coesa e catolicamente endeusada não quer ter dinheiro para SNSs?"
«"Será que o que vale a pena é dar a todos a liberdade de se tratarem se tiverem dinheiro ou seguro privado, por que a Comunidade tão coesa e catolicamente endeusada não quer ter dinheiro para SNSs?"»
Desta vez também assino por baixo e não me considero escardalha.
E mais, o SNS já é uma tradição europeia- então para quê fazer a revolução e impingir outra treta à americana?
Isto faz-me lembrar um economista que geria um hospital e que dizia que tinha de cortar violentamente na sigla de uma despesa que ele via repetidamente, cujo nome me escapa, imaginemos com a sigla S.R.O.
.
O tipo cortou a eito nas notas de despesa do SRO. Cancelou fornecimentos de SRO, assim, sem mais.
.
Entrou-lhe pelo gabinete um médico aflito a dizer que não tinha SORO para o recobro dos doentes.
.
O economista foi despedido. É o que dá falar ou tomar decisões sobre assuntos que não se domina.
.
Rb
Duas questões ?
1. Qual a taxa de abortos por mil gravidezes antes e depois do SNS ? As interrupções de gravidez cobrem a descida na mortalidade infantil ?
2. Qual a evolução das taxas de mortalidade infantil nos outros países ?
1. Qual a taxa de abortos por mil gravidezes antes e depois do SNS ?
A taxa de abortos baixou dramaticamente. Foi o SNS que permitiu o acesso ao planemanto familiar.Baixou também o infanticídio - homicídio de recém nascidos pelas mães.
2 - Nos países africanos onde não existe SNS(sobretudo em certas zonas) continua elevadíssima, catastrófica mesmo.
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