25 maio 2012

a servir outras mulheres


É claro que a mensagem cultural - "Vais sempre precisar de uma mulher" - que citei no post anterior não é a única que resulta daquela regra que a minha mãe anunciava e que fazia cumprir escrupulosamente - "Não quero cá homens na cozinha" - e fazia-o com tamanha autoridade que ninguém ousava contestar (afinal, ela era a autora principal de quatro dos cinco homens que a rodeavam).

Há outra, que é ainda mais importante. Mas antes de me referir a ela, gostaria de comentar a primeira reacção que o quadro que tracei pode suscitar, que é o de  uma mulher a servir cinco homens, tratando-lhes da comida, da roupa e da casa, e sem que eles mexessem uma palha.

É este quadro que é frequentemente invocado para ilustrar a alegada escravidão a que uma mulher se sujeita quando é ao mesmo tempo mãe. E, na verdade, seria assim se não existissem consequências daquele comportamento que ela assumia voluntariamente, e sem que ninguém lho impusesse - "Não quero cá homens na cozinha".

Passo agora à segunda parte da mensagem cultural que aquela frase transmitia aos filhos. É a seguinte: "O vosso lugar para trabalhar não é na cozinha nem em qualquer outra parte da casa. O vosso lugar para trabalhar é lá fora, num campo, numa fábrica ou num escritório. Um dia quando forem homens, é lá o vosso lugar para trabalhar, para trazerem para casa o dinheiro que permita à vossa mulher cuidar de vocês e dos vossos filhos, como eu agora estou a fazer".

Por outras palavras, aquela educação que ela deu aos filhos nunca permitiria a nenhum deles fazer à sua mulher uma proposta com o seguinte teor: "Olha, querida, hoje chateei-me com o patrão, e como está um excelente tempo lá fora, resolvi despedir-me. Agora fico eu em casa a fazer a comida e as camas, a limpar o pó, e também a olhar pelos miúdos. Nos tempos livres, dou umas voltas por aí, que também tenho direito. É a tua vez de ires lá para fora empregar-te num campo, numa fábrica ou num escritório para trazeres dinheiro para casa". Como assim, se eles não sabiam fazer nada em casa, se ela os educou para não saberem fazer nada em casa, se ela os proibia mesmo de fazer qualquer trabalho que envolvesse o cuidado da casa?

Aquela aparente servidão doméstica a que ela se sujeitava, tinha um outro fim em vista: educar os seus filhos para que fossem eles, um dia, como homens, a servir outras  mulheres.

23 comentários:

Vivendi disse...

E não esquecer as mulheres que quiseram trocar as saias pelas calças.

Um moda importada de países não católicos.

Hoje já nem se agrada a gregos nem a troianos! O mercado impôs a cultura superior. O desemprego é geral e no caso dos jovens estamos a criar consequências culturais imprevisíveis!

Fernanda Viegas disse...

Vivendi como já dissemos aqui vezes sem conta, a nossa História é muito importante. Ao pensarmos que o passado é para esquecer, corremos o risco de repetirmos continuamente os mesmos erros, com a presunção de sermos muito originais. É fundamental conhecermos a nossa matriz cultural, pois é nela que nos revemos e é através dela que nos conseguimos assumir no tempo presente. Quanto às calças, convenhamos que no frio, são mais cómodas e quentinhas e a natureza não beneficiou de igual modo todas as Evas do planeta. Sendo assim, elas(calças) também servem para esconder o que não se tem, no caso, umas belas pernas!

Vivendi disse...

Maria,

Referia-me mais à questão profissional. Que foi uma mudança cultural radical da mulher sair de casa para se fazer à jornada do trabalho.

A troca de saia pelas calças não me provoca confusão desde que a mulher não se esqueça da importância da saia.

Fernanda Viegas disse...

Essa agora ultrapassou-me Vivendi "...não se esqueça da importância da saia?" Como assim? Não esqueça de ser mulher? O seu lado feminino?

Vivendi disse...

Maria,

Tá a ver como não foi ultrapassada.

Chegou na resposta que qualquer mulher que se preze deve atingir.

Desejo-lhe um bom fim de semana.

marina disse...

levanta os pratos aos teus irmãos !!!
não levanto não senhor ..não trabalham para mim , têm 2 mãos uma cabecinha tal qual como eu , levantem eles se quiserem.

nada como ser a única rapariga em casa para por tudo em pratos limpos no que respeita a servidão feminina. o meu pai passava-se , mas eu não lhes levantava os pratos ,aos meua irmãos , parecia-me uma clara injustiça , dado não darem nada em troca . mordomias ? isso é que bom .
as coisas que o prof me fez lembrar.

musaranho-coxo disse...

Levanta os pratos aos teus irmãos?

Mas está tudo louco ou quê?

É que nem numa família conservadora alguém dizia uma imbecilidade dessas.

Quem levantava os pratos eram as criadas

":OP

musaranho-coxo disse...

A propósito de pratos, tomem lá a galinha com ervas

http://youtu.be/GM6Cd1BV4rE

marina disse...

ai ai

por acaso até havia uma criada , interna , mas tinha folga..e férias. e uma rapariga tinha de aprender as tarefas domésticas , não é ? como é que depois ia tratar em palminhas o futuro marido ? e reproduzir na perfeição o que se vivia em casa ?
e pensando bem , se calhar quem veio estragar o esquema montado pelas mães para os filhos foram as filhas/irmãs da era da " libertação das mulheres " :))) que também queriam ir prós copos à noite e essas coisas todas que os irmãos . até os mais novos , podiam fazer na boa. eram cá umas guerras. e a guerra fortifica , pq os meninos , já com filhos e tudo , ainda são da mãmã e eu não.

e o PA não pode analisar isto de sociedades femininas sem abordar a conhecida rivalidade entre mães e filhas , já agora. e aquela coisa tão estranha de receitas de cozinha segredos de estado que não se partilham ( quem sabe a falta de espírito associativo e o fazer caixinha derivam desses segredos domésticos :))

marina disse...

as mães tornam os filhos homens fracos e dependentes , é o que eu já percebi. e a sociedade portuguesa é fraca e dependente. montando aqui uma coisa qualquer à Aristóteles , pondo pelo meio a moderna falta de ritos de passagem à idade adulta ( pai autoritário , prof de régua na mão , coronel humilhador ) que até lá na mais remota tribo de África sabem ser essencial ao rapaz e temos que as análises do prof. PA pecam por defeito.

zazie disse...

Mas aprender tarefas domésticas é uma coisa, levantar os pratos aos irmãos é outra.

Eu aprendi tudo. Não sou da geração café que apenas aprendeu a fumar que nem homens.

Mas, ainda hoje tenho amigas que ficam admiradíssimas quando descobrem que eu até sei fazer tricot ou coser à máquina e coisas assim.

Porque lá encasquetaram que quem formata computadores ou arranja torneiras e sistemas de rega não pode saber tarefas femininas

ahahahah

Agora fazer de criada é que nunca. Isso é servilismo bacoco.

E são essas coisas que depois levam a que muitas mulheres tornem os filhos moles.

Zephyrus disse...

Sinto que fui muito mal educado. Nunca me puseram a fazer uma cama, arrumar um quarto, levantar uma mesa, arrumar uma peça de roupa. Quando tinha 16 anos quis trabalhar no mês de Agosto. Os meus pais ficaram escandalizados, quase me castigaram. Fiquei com a noção que seria uma vergonha para a família. O que mais os preocupava seria a troça de que seríamos alvo, isto porque felizmente temos algumas posses! Mas eu achava que queria ser independente... mas depois aprendi que «em Roma sê romano»! E que afinal, nalgumas coisas, os meus pais até tinham muita razão!

Quando sai de casa foi o desastre. Ao fim de uma semana o meu quarto tinha uma desorganização brutal. Não sabia organizar o tempo, não tinha hábitos de arrumação! Excesso de mimo em casa!

Isto contrasta com o que sucede em famílias de amigos da Holanda. Por lá os jovens saem de casa antes dos 20, por vezes até antes dos 18. Logo na adolescência aprendem a cozinhar e a fazer tarefas domésticas. Ficam mais independentes e são muito mais desligados da família. E em parte só lhes faz bem!

zazie disse...

Ficar independente não é ficar desligado da família.

E fazer uma série de trabalhos antes de acabar o curso ou o mestrado é uma aprendizagem para a vida.

Sorte que nem os meus pais pensavam o contrário e não tinham qualquer preconceito palerma.

Muito menos eu. A primeira coisa que incentivei foi precisamente isso.

zazie disse...

Eu acho que v.s falam assim porque nem tiveram sequer uma educação conservadora de tradição católica.

Uma educação conservadora inclui aprender isso tudo ainda na pré-adolescência, em acampamentos de escuteiros.

zazie disse...

Está bem que os escutas também são criação prot. Mas os católicos adoptaram e adoptaram bem.

O que os meus amigos me fartaram de chagar os cornos por eu pôr o pimpolho nos escuteiros.

Era uma reaccionarice e mais beatice e não sei quantos.

Mandei-os passear. Nunca me deixei influenciar por opiniões. E nestas coisas também nunca tive parceiro a dizer o contrário.

muja disse...

Fez a Zazie muito bem! Posso falar porque também lá andei e posso-lhe garantir que filho ou filha meu também para lá vai. É certinho.

muja disse...

Além do mais, em Portugal, há os escuteiros católicos do CNE, e os da AEP que, embora contenham a dimensão espiritual, não estão vinculados a nenhuma organização religiosa em particular.

Pelo que desculpas de beatice, etc, é tanga.

muja disse...

Se bem que as lides domésticas, a minha mãe fez questão que eu as aprendesse desde cedo.
Dizia ela: "Hoje em dia as mulheres já não estão para serem tuas criadas, não penses que vais ter uma como o teu pai".

zazie disse...

Pois então estamos de acordo. Eu acho que os escuteiros são uma excelente formação para a vida.

Não só pela autonomia que os miúdos aprendem em pequenos, como na ajuda ao próximo e no sentido de responsabilidade perante os outros.

É uma mini formação de aprendizagem de moral e família mil vezes melhor que a tropa.

zazie disse...

Mas a sério que o que me surpreendeu foi o que a wika/kiwi/marina contou.

A tal cena do pai dizer para a filha: "levanta os pratos dos teus irmãos".

É coisa que nem imaginava que se poderia dizer e que tenho a certeza que nunca, em tempo algum, alguém teria a triste ideia de me dizer.

Nunca. E ainda por cima em família onde o habitual era a criada fazer isso.

Vai a criada de férias e a filha fica a fazer de criada dos próprios irmãos!

Isto é um insulto. Eu nem imagino o que aconteceria se o meu maninho alguma vez tivesse tido a triste ideia de dizer para eu lhe levantar o prato da comida.

É que apanhava logo com ele pela cabeça abaixo.

zazie disse...

Na volta por isso é que ela agora é feminista!

É o grito do ipiranga depois de ter deixado ser capacho.

Que coisa maluca. Eu não sou feminista e até me encanita essa treta. Mas sempre fui muito senhora do meu nariz e nem em pequenina alguma vez alguém ia ter dúvidas disso.

zazie disse...

Por isso é que eu não acredito em militâncias nem em vitimizações- faz-se aquilo que outros deixam fazer.

Se nunca se deixar fazer ninguém vai sequer atrever-se a abusar.

Pedro Sá disse...

Pelos vistos o PA acha que viver às custas de outro (neste caso, o marido) é um privilégio...