Eu tinha compreendido perfeitamente a explicação da D. Angelina e a razão por que naquele dia a pescada estava 2 euros mais cara do que na véspera. Aquilo que eu não tinha ainda compreendido é porque é que na véspera a pescada custava 10 euros por quilo, e não 5 ou 50. Isso, disse-me a D. Angelina, só o marido é que podia explicar. Ele tinha chegado tarde do mar e ainda estava a dormir. Mas eu que passasse lá no dia seguinte, que ela tirava-o cedo da cama.
Assim fiz. Quando cheguei, mestre Januário atendia duas freguesas. A um sinal da mulher, chegou-se a mim e perguntou se era eu que queria saber porque é que há dois dias a pescada estava a 10 euros o quilo. Eu disse que sim. Ele pegou então num papel, tirou o lápis de trás da orelha e começou a adicionar parcelas enquanto falava.
“A construcção do barco... a madeira está caríssima ... mais as velas e os motores ... pagar aos ajudantes ... mais as redes, os enguiços e os anzóis ...”, e no fim dividiu pelo número de pescadas. “Dá 9 euros por quilo de pescada ... a diferença para 10 é o meu ganho, a compensação do meu trabalho”.
Fiquei convencido. Tudo fazia sentido. E foi então, que, depois de lhe agradecer, e antes de partir, lhe perguntei: “E o mar, não entra no preço?”. Não, respondeu ele: “Esse é, de facto, o recurso mais valioso para a pesca mas, graças a Deus, é de borla. E também os ventos, o luar e as estrelas que nos guiam....”
Saí de lá maravilhado. Afinal, o valor da pescada era muito superior ao preço, porque o recurso mais valioso, o mar - mas também os ventos, o luar e as estrelas - não estava incluído no preço. Era uma dádiva de Deus. Afinal, a teoria subjectiva do valor estava errada, porque dizia que o valor era igual ao preço; e a teoria do valor trabalho também, porque essa dizia que o valor era igual aos salários pagos ao mestre Januário e seus ajudantes, aos homens que fizeram os barcos, as redes e os anzóis, e às mulheres que fizeram as velas. Estava tudo errado.
E foi assim que cheguei à teoria católica do valor. O valor está nas coisas criadas, em todas as coisas criadas, nas pessoas, nas obras humanas, nos elementos da natureza. E chega-se a ele inquirindo, e inquirindo não apenas as pessoas, mas também os produtos do engenho humano e a natureza, inquirindo tudo - o mar, o sol, o luar, as estrelas -, todas as obras da criação.
Esta atitude de inquisição - de tudo, mas literalmente de tudo - fez-me pela primeira vez duvidar se esta atitude de espírito, que é a atitude do espírito científico moderno, é uma criação da cultura protestante, como ela reivindica ser, ou se, pelo contrário, é algo que esta cultura foi buscar ao catolicismo. Hoje não tenho dúvidas acerca da resposta. Foram buscar praticamente tudo ao catolicismo, e nunca lhe deram crédito por nada. Bem pelo contrário.
De qualquer maneira, eu sei agora as respostas que posso esperar da próxima vez que três académicos economistas se juntarem numa conferência para discutir a teoria do valor: Qual é a fonte do valor das coisas?
-É o trabalho, diz o socialista luterano.
-É o mercado, diz o liberal anglicano.
-É Deus, diz o católico romano.
Mas esta é precisamente a palavra maldita que nenhum dos outros quer ouvir.
Assim fiz. Quando cheguei, mestre Januário atendia duas freguesas. A um sinal da mulher, chegou-se a mim e perguntou se era eu que queria saber porque é que há dois dias a pescada estava a 10 euros o quilo. Eu disse que sim. Ele pegou então num papel, tirou o lápis de trás da orelha e começou a adicionar parcelas enquanto falava.
“A construcção do barco... a madeira está caríssima ... mais as velas e os motores ... pagar aos ajudantes ... mais as redes, os enguiços e os anzóis ...”, e no fim dividiu pelo número de pescadas. “Dá 9 euros por quilo de pescada ... a diferença para 10 é o meu ganho, a compensação do meu trabalho”.
Fiquei convencido. Tudo fazia sentido. E foi então, que, depois de lhe agradecer, e antes de partir, lhe perguntei: “E o mar, não entra no preço?”. Não, respondeu ele: “Esse é, de facto, o recurso mais valioso para a pesca mas, graças a Deus, é de borla. E também os ventos, o luar e as estrelas que nos guiam....”
Saí de lá maravilhado. Afinal, o valor da pescada era muito superior ao preço, porque o recurso mais valioso, o mar - mas também os ventos, o luar e as estrelas - não estava incluído no preço. Era uma dádiva de Deus. Afinal, a teoria subjectiva do valor estava errada, porque dizia que o valor era igual ao preço; e a teoria do valor trabalho também, porque essa dizia que o valor era igual aos salários pagos ao mestre Januário e seus ajudantes, aos homens que fizeram os barcos, as redes e os anzóis, e às mulheres que fizeram as velas. Estava tudo errado.
E foi assim que cheguei à teoria católica do valor. O valor está nas coisas criadas, em todas as coisas criadas, nas pessoas, nas obras humanas, nos elementos da natureza. E chega-se a ele inquirindo, e inquirindo não apenas as pessoas, mas também os produtos do engenho humano e a natureza, inquirindo tudo - o mar, o sol, o luar, as estrelas -, todas as obras da criação.
Esta atitude de inquisição - de tudo, mas literalmente de tudo - fez-me pela primeira vez duvidar se esta atitude de espírito, que é a atitude do espírito científico moderno, é uma criação da cultura protestante, como ela reivindica ser, ou se, pelo contrário, é algo que esta cultura foi buscar ao catolicismo. Hoje não tenho dúvidas acerca da resposta. Foram buscar praticamente tudo ao catolicismo, e nunca lhe deram crédito por nada. Bem pelo contrário.
De qualquer maneira, eu sei agora as respostas que posso esperar da próxima vez que três académicos economistas se juntarem numa conferência para discutir a teoria do valor: Qual é a fonte do valor das coisas?
-É o trabalho, diz o socialista luterano.
-É o mercado, diz o liberal anglicano.
-É Deus, diz o católico romano.
Mas esta é precisamente a palavra maldita que nenhum dos outros quer ouvir.
E fica mais uma vez lembrado por que é que os protestantes excluem os católicos dos debates intelectuais. Perdem sempre.
Sem comentários:
Enviar um comentário