Uma das consequências do sucesso técnico da medicina é que as indicações para a maior parte dos procedimentos foram, por assim dizer, liberalizadas. Quando o médico propõe um tratamento equaciona de forma simples os respectivos “custos” e benefícios. Nos custos entram os riscos para a vida do doente, possíveis complicações e até resultados que possam ficar aquém das expectativas. Nos benefícios entram as melhorias que se podem obter com o tratamento em causa.
Reparem nas aspas que utilizei em “custos”, para sublinhar que não me estava a referir a custos financeiros. Em nenhum ponto do processo de decisão, pelo menos no SNS, o médico ou o doente considera o custo financeiro dos tratamentos propostos. Esse custo é suportado pelo Estado.
Ora à medida que os riscos diminuem, mesmo um benefício marginal começa a tornar-se interessante para o doente/cliente.
Uma operação a um menisco, por exemplo, num doente de 70 anos que quer dar uns chutos na bola ao domingo de manhã, com os netos, era impensável no passado. Mas como os riscos diminuíram extraordinariamente, os benefícios, hoje, superam os riscos e a balança pende para a realização da intervenção cirúrgica.
O mesmo poderia ser dito para uma intervenção às cataratas, à próstata ou ao coração.
Neste contexto, é muito fácil de perceber que as despesas com a saúde vão continuar a crescer e que as “listas de espera” vão continuar a existir, porque o sucesso da medicina baixou de tal modo a fasquia que até quem não está doente "necessita de ser tratado".
Os doentes já não procuram apenas a cura, querem também uma espécie de “tunning”, à custa do erário público, claro está.
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