26 junho 2009

são muito poucos


Esta tarde, depois de escrever este post, eu receei estar a ser injusto com muitos portugueses e muitos católicos, e seguramente com alguns comentadores habituais deste blogue. Também a cultura católica possui pessoas imensamente decentes, de grande nível intelectual e genuína religiosidade. Entre os comentadores habituais do blogue, pensei em primeiro lugar no Miguel, que sempre me pareceu ser um católico praticante. Pensei também no D. Costa que, embora não sendo religioso, conseguiu libertar-se daquilo que de pior tem a cultura católica, e que tenho vindo a retratar ultimamente, talvez por força da sua experiência de vida em país protestante (Holanda? Alemanha?).

Há poucos minutos o Miguel colocou um comentário ao meu último post. Tenho prazer em reproduzi-lo. Eis aqui o exemplo de um homem da tradição católica que sabe lidar com diferenças de opinião de forma serena, educada e racional. A grande diferença entre as duas tradições é que que na tradição católica estes homens são muito poucos, ao passo que na tradição protestante eles constituem a maioria.
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" Caro PA
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Os seus últimos textos fizeram-me chegar a uma conclusão. Apesar das muitas qualidades que os portugueses inegavelmente têm, se queremos algum dia alcançar a plena democratização vamos ter no entanto que mudar muita coisa. E vamos ter que mudar profundamente. E em relação a isso, primeiro a república e depois o 25 de Abril pouco mais fizeram para além de nos alijar de alguma simbologia, pois não alteraram na sua essência aquilo que somos, no âmago da nossa cultura, nos pressupostos que formataram a nossa maneira de pensar e por conseguinte as nossas acções e os nossos comportamentos.
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Nos últimos trinta anos, quando muito libertaram a boca do povo, dando-lhe a tão propagandeada liberdade de expressão, mas contudo não lhe libertaram a mente. O português é intelectualmente preguiçoso, e por isso da sua boca, hoje como ontem, só sai aquilo que a cartilha lhe ensinou e lhe ensina. A cartilha que outrora foi a verdade propalada pelas autoridades eclesiásticas e aristocráticas, mas que hoje em dia é a cartilha dos líderes políticos, dos chamados líderes de opinião, dos intelectuais, dos novos profetas da desgraça, dos padrecas de serviço.
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E se esta não é suficiente para conseguir contrariar o argumento lógico e fundamentado, inquirir racionalmente o pensamento divergente, o que sai da boca dos portugueses são susceptibilidades, desculpas, impropérios, ataques pessoais e condenações morais. E porque a verdade continua a vir de cima, como no passado, os portugueses, tementes ao suplício da cruz, alheios à vitória da vida sobre a morte, moldam-se no exemplo e não mudam. Portugal está hoje numa encruzilhada, dividido entre o ser e o querer ser. Mas os portugueses vão ter que escolher, mais cedo ou mais tarde, sob pena de Portugal mergulhar numa profunda crise de identidade, a qual, aliás, já se manifesta e adivinha. E é bom que queiram escolher, que decidam escolher, que ousem escolher, que não deixem, mais uma vez, que alguém decida por eles.
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Miguel
Anonymous 06.26.09 - 10:25 pm # "
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Miguel,
Você interpretou-me muito bem. Era aí que eu queria chegar.
PA

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