27 março 2009

Nenhum


O processo está agora completo para ir a julgamento. Contém milhares de factos, metade dos quais são falsos, três mil quatrocentos e setenta e oito horas de gravações de conversas telefónicas feitas pela polícia, milhares de depoimentos de testemunhas, três quartos dos quais são mentira. São 27 476 páginas divididas por 35 volumes. Admitamos que o processo é mediático.

Qual é o juiz que quer julgar este processo? Nenhum.

O juiz faz parte de uma população de maus julgadores, e ele não é excepção. Como a população julga mal, metade da opinião pública é a favor da condenação do reu e a outra metade é contra. O juiz sabe que qualquer decisão que tome porá metade da opinião pública contra si. Para além do trabalho de ler 27 476 páginas, o juiz sabe que, podendo-se mentir em tribunal, qualquer facto invocado por uma das partes será imediatamente contestado pela outra. O julgamento será uma farsa.

A soluçâo ideal será encontrar alguma deficiência no processo que inviabilize o julgamento (como aqui). Se o processo fôr mesmo a julgamento, o juiz sabe que no final não estará em condições de produzir uma decisão, não apenas porque leu o processo à vol d'oiseau, como porque é impossível apurar a verdade entre tantas mentiras que o processo contém e os advogados reiteram segundo lhes convém. Não é possível fazer justiça, mas o juiz tem de produzir uma decisão.

Dois erros são possíveis: inocentar um culpado ou condenar um inocente. Este segundo erro é mais grave que o primeiro e é cometido quando o juiz pronuncia uma decisão de condenação. Para evitar cometer este erro, então, ele não condena. Tal significa, porém, que este sistema já não faz mais justiça, ou porque não leva os arguidos a julgamento ou porque, levando-os, não os condena.

Sem comentários: