04 março 2009

Maldita calculadora


A edição de hoje do Jornal de Negócios (JdN) publica uma interessante - e enigmática - nota acerca do Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social (FEFSS). Escreve o JdN que "com 20% do seu património aplicado em acções e 67% em dívida pública (...) o FEFSS registou uma desvalorização de 4,37% no primeiro semestre de 2008". Mais adiante no artigo, é citado o presidente do Instituto de Gestão dos Fundos de Capitalização da Segurança Social, o dr. Manuel Baganha, em que este afirma que "o FEFSS terminou o ano com uma desvalorização de 3,86%" concluindo-se, portanto, que houve alguma recuperação do valor patrimonial durante o segundo semestre. Enfim, não é a primeira vez que aqui comento a evolução do nosso FEFSS e, como de seguida demonstrarei, as minhas contas, desgraçadamente, voltam a não bater certo com aquilo que agora foi divulgado!

Então, daquilo que pude ler no artigo do JdN, não encontrei nenhuma evidência de que, durante o segundo semestre de 2008, tenha ocorrido alguma mudança significativa na composição da carteira do FEFSS, face ao período compreendido entre Janeiro e Junho. Assim, a exposição em acções ter-se-á mantido estável em redor dos 20% do seu património total. Ou seja, o equivalente a um PPR de categoria C (investimento entre 15 e 35% em acções) que, em média, desvalorizaram cerca de 11% nos últimos doze meses. De acordo com a APFIPP, a associação do sector, o PPR que menos perdeu, ainda assim, desvalorizou 4,1% nos últimos doze meses. Em suma, apesar do ligeiro desencontro de datas - no caso dos PPR's, os valores reportam-se aos últimos doze meses terminados em 13 de Fevereiro de 2009; no caso do FEFSS, o período analisado refere-se ao ano civil de 2008 - constatamos que o fundo da Segurança Social desvalorizou muito menos que a média dos PPR's equiparáveis e, possivelmente, até menos que qualquer um destes. Notável!

Contudo, os números não batem certo. Assumindo que a alocação em acções não se afastou significativamente dos 20% - como dá a entender o JdN - não entendo como é que no segundo semestre foi possível atingir uma valorização (ainda que residual) do FEFSS!?! Nesse período, reparem, o PSI20 perdeu 29% do seu valor, o Eurostoxx 50 (onde estão cotadas as 50 maiores empresas da zona euro) desvalorizou 27% e o S&P500 (o índice de acções mais abrangente dos Estados Unidos) registou uma perda de 29%. Portanto, se aplicarmos a ponderação de 20% à desvalorização média do mercado accionista (ou seja, igual a 20% * 28) chegamos à conclusão de que, apenas à custa da componente "acções", o FEFSS deverá ter perdido 5,6% do seu valor patrimonial durante os últimos 6 meses de 2008. Significa isto que, para confirmar a recuperação global do FEFSS durante o segundo semestre de 2008, os gestores da Segurança Social, em média, terão tido mais valias de 7,7% (não anualizadas) nas restantes componentes do portefólio do fundo. Infelizmente, o tipo de investimentos realizados nesta última porção do FEFSS, na sua maioria em instrumentos de dívida pública nacional, não permitem ganhar 7,7% em 6 meses nem nada que se pareça!

Portanto, a não ser que alguma coisa me esteja a escapar na estrutura da componente accionista do FEFSS - por exemplo, uma redução de 20 para 5% do investimento em acções - não vejo modo de chegar aos números veiculados pela Segurança Social. Assim, dada a importância desta matéria, seria conveniente que a transparência fosse maior e que todos os elementos fossem disponibilizados ao público. Infelizmente, receio que não será assim. De acordo, com o JdN, "o relatório e contas de 2008 do FEFSS ainda não é conhecido, não sendo certo que venha a ser divulgado no primeiro semestre (de 2009)"!

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