No meu post anterior afirmei que a classe dos professores não ocupa mais o seu lugar de elite natural em Portugal. Que classe a substituiu, que classe se encontra agora no seu lugar, predominantemente representada nos lugares da governação e da política e nas primeiras páginas dos jornais, das rádios e das televisões?
A dos juristas. A resposta não deve ser surpreendente. Se Portugal importou desde a Revolução de 1974 as instituições da democracia liberal que são típicas das sociedades protestantes - sociedades cuja elite natural é a classe dos juristas -, seria apenas de esperar que os juristas emergissem na vida pública portuguesa com a mesma importância aumentada e exposição acrescida.
Porém, a despeito da Revolução e da importação de instituições que lhe são estranhas, Portugal não deixou de ser uma sociedade de tradição católica. A questão que se coloca é então a de saber se os juristas podem numa sociedade de tradição católica constituir a sua elite natural. Antecipando a resposta, que é negativa, eu pretendo neste post dar um passo mais e demonstrar que a classe dos juristas constitui a classe mais destrutiva que pode existir num país de tradição católica.
Uma sociedade protestante encontra a sua união em torno da ideia de justiça. Por isso, os seus cidadãos possuem o sentido de justiça em alto grau, e os juristas, para além do sentido de justiça, possuem também a formação técnica e filosófica adequada, para emergirem como a sua elite natural. Numa sociedade de tradição católica é diferente. Os cidadãos não possuem o sentido de justiça; e os juristas, pela sua formação, tendem a exponenciar as consequências desta falta do sentido de justiça. O resultado inevitável é que, sempre que os juristas ocupam generalizadamente as posições de topo nesta sociedade - posições que, em condições normais, pertenceriam aos professores, a elite natural - eles destroem o sistema de justiça, lançando a sociedade na anarquia que é o preâmbulo do seu desabamento.
É esta tese que me proponho agora provar, começando com a afirmação de que numa sociedade de tradição católica, como Portugal, as pessoas não possuem sentido de justiça. A prova é fácil de apresentar porque ela assenta numa outra proposição já demonstrada - a de que numa sociedade de tradição católica, como Portugal, o homem do povo não possui opinião própria sobre qualquer assunto, em resultado do seu extremo liberalismo e da sua tolerância excessiva que é fruto da flexibilidade doutrinal do catolicismo. (Cf. aqui).
A capacidade principal para o exercício da justiça é a capacidade de julgamento, a capacidade para formar uma opinião - uma opinião forte e determinada - sobre o bem e o mal. O homem comum da tradição católica não possui esta capacidade, ele aceita tudo como bom dentro de limites que são muito amplos, como o limite da não-violência. Desde que não haja violência, está tudo bem para ele, ele é tolerante em relação a tudo. Ele é capaz de pronunciar julgamento sobre um crime de homicídio, mas é totalmente incapaz de o fazer sobre uma litigação de natureza civil ou de natureza económica ou financeira, que são de longe as mais numerosas na sociedade; em relação a estas, ele não possui capacidade para julgar pela simples razão de que não tem opinião sobre o assunto, são coisas que não lhe dizem respeito. A frase popular "Vale tudo, menos tirar olhos", exprime com inteira exactidão até que ponto pode chegar a incapacidade do homem comum português para fazer justiça - ao limite do "tirar olhos" .
A formação dos juristas só agrava a situação. Os juristas de uma sociedade católica que adoptou a democracia, são predominantemente homens e mulheres do povo e, portanto, homens e mulheres que tal como o povo de onde sairam, não possuem o sentido de justiça. Por outro lado, eles são formados nas artes da litigação e com vista a resolver os conflitos que emergem na sociedade. Eles vivem do conflito e da litigação, e daí o seu natural enviesamento para fomentarem o conflito. E assim eles dão lugar a uma contradição insanável numa sociedade de tradição católica em que se tornaram os principais ocupantes dos lugares da vida política e das instituições.
Por um lado, os juristas tendem a encorajar o conflito e a litigação. Por outro lado, esta é uma sociedade que, não possuindo o sentido de justiça, não consegue resolver conflitos, excepto os mais extremos, geralmente envolvendo violência. Os casos de justiça sucedem-se, assim, aos olhos da opinião pública, os juristas aparecem nas rádios nos jornais e nas televisões a pronunciar opinião sobre eles, aqueles que trabalham no sector judicial (advogados, juizes, magistrados, consultores jurídicos, polícias até) dão explicações e mais explicações sobre os casos que desfilam em catadupa perante os olhos de todos. Porém, nunca há condenados, porque esta sociedade não consegue fazer justiça. A razão - não é de mais insistir - é que ela não possui o sentido de justiça.
O sentimento de impunidade instala-se na sociedade e com ele surgem os primeiros indícios do caos e da anarquia, a ideia generalizada de que "Vale tudo". Mas enquanto "não se tirarem olhos", enquanto o sistema de justiça fôr capaz de punir os crimes violentos, já que não consegue punir mais nada, a sociedade ainda se aguenta. O caos instalado na sociedade, porém, e no próprio sistema de justiça, deixa antever que chegará o momento que já nem isso ele conseguirá fazer, o momento em que até "tirar olhos" passa a valer. Nesse momento, quando o sistema de justiça já não consegue punir mesmo a violência física extrema, quando os criminosos são deixados em liberdade ou na impunidade, ou quando já nem sequer são apanhados, a sociedade atingiu o limite. Está pronta a desabar.
A dos juristas. A resposta não deve ser surpreendente. Se Portugal importou desde a Revolução de 1974 as instituições da democracia liberal que são típicas das sociedades protestantes - sociedades cuja elite natural é a classe dos juristas -, seria apenas de esperar que os juristas emergissem na vida pública portuguesa com a mesma importância aumentada e exposição acrescida.
Porém, a despeito da Revolução e da importação de instituições que lhe são estranhas, Portugal não deixou de ser uma sociedade de tradição católica. A questão que se coloca é então a de saber se os juristas podem numa sociedade de tradição católica constituir a sua elite natural. Antecipando a resposta, que é negativa, eu pretendo neste post dar um passo mais e demonstrar que a classe dos juristas constitui a classe mais destrutiva que pode existir num país de tradição católica.
Uma sociedade protestante encontra a sua união em torno da ideia de justiça. Por isso, os seus cidadãos possuem o sentido de justiça em alto grau, e os juristas, para além do sentido de justiça, possuem também a formação técnica e filosófica adequada, para emergirem como a sua elite natural. Numa sociedade de tradição católica é diferente. Os cidadãos não possuem o sentido de justiça; e os juristas, pela sua formação, tendem a exponenciar as consequências desta falta do sentido de justiça. O resultado inevitável é que, sempre que os juristas ocupam generalizadamente as posições de topo nesta sociedade - posições que, em condições normais, pertenceriam aos professores, a elite natural - eles destroem o sistema de justiça, lançando a sociedade na anarquia que é o preâmbulo do seu desabamento.
É esta tese que me proponho agora provar, começando com a afirmação de que numa sociedade de tradição católica, como Portugal, as pessoas não possuem sentido de justiça. A prova é fácil de apresentar porque ela assenta numa outra proposição já demonstrada - a de que numa sociedade de tradição católica, como Portugal, o homem do povo não possui opinião própria sobre qualquer assunto, em resultado do seu extremo liberalismo e da sua tolerância excessiva que é fruto da flexibilidade doutrinal do catolicismo. (Cf. aqui).
A capacidade principal para o exercício da justiça é a capacidade de julgamento, a capacidade para formar uma opinião - uma opinião forte e determinada - sobre o bem e o mal. O homem comum da tradição católica não possui esta capacidade, ele aceita tudo como bom dentro de limites que são muito amplos, como o limite da não-violência. Desde que não haja violência, está tudo bem para ele, ele é tolerante em relação a tudo. Ele é capaz de pronunciar julgamento sobre um crime de homicídio, mas é totalmente incapaz de o fazer sobre uma litigação de natureza civil ou de natureza económica ou financeira, que são de longe as mais numerosas na sociedade; em relação a estas, ele não possui capacidade para julgar pela simples razão de que não tem opinião sobre o assunto, são coisas que não lhe dizem respeito. A frase popular "Vale tudo, menos tirar olhos", exprime com inteira exactidão até que ponto pode chegar a incapacidade do homem comum português para fazer justiça - ao limite do "tirar olhos" .
A formação dos juristas só agrava a situação. Os juristas de uma sociedade católica que adoptou a democracia, são predominantemente homens e mulheres do povo e, portanto, homens e mulheres que tal como o povo de onde sairam, não possuem o sentido de justiça. Por outro lado, eles são formados nas artes da litigação e com vista a resolver os conflitos que emergem na sociedade. Eles vivem do conflito e da litigação, e daí o seu natural enviesamento para fomentarem o conflito. E assim eles dão lugar a uma contradição insanável numa sociedade de tradição católica em que se tornaram os principais ocupantes dos lugares da vida política e das instituições.
Por um lado, os juristas tendem a encorajar o conflito e a litigação. Por outro lado, esta é uma sociedade que, não possuindo o sentido de justiça, não consegue resolver conflitos, excepto os mais extremos, geralmente envolvendo violência. Os casos de justiça sucedem-se, assim, aos olhos da opinião pública, os juristas aparecem nas rádios nos jornais e nas televisões a pronunciar opinião sobre eles, aqueles que trabalham no sector judicial (advogados, juizes, magistrados, consultores jurídicos, polícias até) dão explicações e mais explicações sobre os casos que desfilam em catadupa perante os olhos de todos. Porém, nunca há condenados, porque esta sociedade não consegue fazer justiça. A razão - não é de mais insistir - é que ela não possui o sentido de justiça.
O sentimento de impunidade instala-se na sociedade e com ele surgem os primeiros indícios do caos e da anarquia, a ideia generalizada de que "Vale tudo". Mas enquanto "não se tirarem olhos", enquanto o sistema de justiça fôr capaz de punir os crimes violentos, já que não consegue punir mais nada, a sociedade ainda se aguenta. O caos instalado na sociedade, porém, e no próprio sistema de justiça, deixa antever que chegará o momento que já nem isso ele conseguirá fazer, o momento em que até "tirar olhos" passa a valer. Nesse momento, quando o sistema de justiça já não consegue punir mesmo a violência física extrema, quando os criminosos são deixados em liberdade ou na impunidade, ou quando já nem sequer são apanhados, a sociedade atingiu o limite. Está pronta a desabar.
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