05 fevereiro 2009

Marketing


"(...) Lembro-me sempre de uma feira de vinhos em Bordéus. Os produtores portugueses abriam de manhã o stand e esperavam calmamente à conversa uns com os outros por visitas e provas, com os jornalistas estrangeiros a passarem no corredor (...)"
(NB, comentário a este post)

Gostaria neste post de tratar um outro factor de natureza cultural que contribui para a enorme incapacidade dos portugueses para promoverem os seus produtos em comparação, por exemplo, com os ingleses e os americanos. Trata-se aqui, genuinamente, de uma diferença entre católicos e protestantes que aflorei en passant noutro post (aqui).

Até à Reforma Religiosa a Igreja Católica dominou, durante muitos séculos, o mercado religioso da Europa Ocidental em regime de monopólio. Um monopólio, dispondo do mercado em exclusivo, não precisa de se promover, sobretudo quando não se sente ameaçado. Até ao início do século XVI, a Igreja Católica tinha um produto, era o único, os clientes ou compravam aquele produto ou não compravam mais nenhum.

As condições mudaram com a Reforma Religiosa. Novos concorrentes emergiram - as seitas protestantes -, disputando agressivamente um mercado que até então era monopólio da Igreja Católica. Os novos concorrentes forçaram a sua entrada, e conquistaram quota de mercado, pela via de um proselitismo agressivo que ia junto das pessoas, que fazia porta-a-porta, no sentido de as persuadir das vantagens do seu produto - que era a sua interpretação das Escrituras -, face ao produto convencional oferecido pela Igreja Católica. É no proselitismo protestante que se encontra a origem do marketing moderno.

Não surpreende, por isso, que os campeões do marketing sejam os países protestantes. Na tradição protestante, as seitas vão junto do povo e procuram convencê-lo. Esta é uma tradição em que o comprador é soberano porque são as decisões do povo que determinarão, em última instância, o sucesso respectivo de cada seita.

Diferente é a tradição católica. A despeito da agressividade protestante saída da Reforma, houve países da Europa onde a concorrência protestante nunca penetrou. À frente de todos - verdadeiros baluartes da Contra-Reforma - estiveram Portugal e Espanha. Enquanto a Reforma se desenvolvia na Europa e os portugueses viajavam pelo mundo, eles continuavam a ser identificados sempre da mesma maneira: "Se é português é católico".

Em Portugal e Espanha - e em todos os países que deles descenderam - a Igreja Católica continuou a possuir o monopólio da mensagem religiosa. Do alto da sua posição monopolística, ela continuou a oferecer o seu produto, que era único. Quem quisesse comprar, comprava, quem não quisesse, não comprava. Não havia outro. Esta é uma tradição em que a soberania não está no consumidor. Está no produtor. Mas se assim é, para quê o proselitismo, para quê a promoção e o marketing?

Os portugueses são, assim, salvo raras excepções e por virtude da sua tradição cultural, um zero-à-esquerda em termos de promoção e marketing. Eles não possuem, sequer, uma palavra na sua Língua que traduza a ideia do marketing - tiveram de a importar -, significando que a ideia lhes é culturalmente estranha. Os portugueses, como a Igreja Católica, produzem às vezes produtos de altíssima qualidade. Mas depois ficam à espera que os interessados lhos vão comprar.

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