27 janeiro 2009

... e chorar por mais


Neste post eu gostaria de voltar ao tema iniciado aqui acerca da comparação entre a cultura inglesa e a cultura portuguesa do duplo ponto de vista da sua esfera exterior ou pública e da sua esfera interior ou privada. (A comparação vale com mais generalidade para aquilo que tenho chamado a cultura protestante e a cultura católica). No post referido, afirmei a superioridade da esfera pública inglesa face à portuguesa, e a superioridade da esfera privada portuguesa face à inglesa.
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A cultura inglesa (protestante) privilegia o aspecto exterior das coisas, o público sobre o privado, a aparência sobre a substância. Esta é a cultura do apelo às massas, do proselitismo protestante e da democracia. Tudo nesta cultura parece ser melhor do que aquilo que, na realidade, é. Esta é também a cultura do marketing e das técnicas de persuasão. É uma cultura em que tudo se vende e, para vender, é necessário, em primeiro lugar, que o produto tenha uma boa aparência.
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Diferente é a cultura portuguesa (católica). Esta é uma cultura aristocrática ou de escol, que privilegia o privado sobre o público, a substância sobre a aparência. Os padres não batem às portas para angariar crentes. Pelo contrário, eles estão na Igreja de porta aberta - quem quiser entra, quem não quiser não entra. Esta é uma cultura que dispensa o marketing porque é uma cultura em que tudo se compra - até a salvação da alma. Esta cultura não apela às massas. Pelo contrário, fica à espera que as massas sejam seduzidas por ela.
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Um português que vá viver para Inglaterra ficará encantado nos primeiros tempos com o aspecto exterior da sociedade inglesa, a sua vida pública e intelectual, a sua decência e o seu civismo. Se não fôr um mero turista em visita breve, e permanecer lá muito tempo, a prazo vai-se desencantar com a falta de qualidade da vida familiar, das relações interpessoais, da alimentação e dos cuidados pessoais e pela falta de decência, e nalguns casos, absoluta brutalidade de muitos comportamentos privados.
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Pelo contrário, um inglês que venha viver para Portugal ficará, no início, horrorizado com a qualidade da vida pública - a falta de civismo, a má qualidade da vida política, intelectual e jornalística. Se permanecer por cá, a probabilidade é elevada que, a prazo, fique seduzido pela doçura das relações interpessoais e da família, pela alimentação e os cuidados pessoais, pela enorme decência dos portugueses nos seus comportamentos privados. Assim sucedeu a este inglês, ao ponto de pôr a sua experiência em livro.
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No fim, a diferença entre estas culturas corresponde à diferença entre as suas maçãs. É como comparar maçãs da Nova Zelândia (uma ex-colónia inglesa) com maçãs das Caldas da Raínha. As primeiras têm uma excelente aparência, mas não sabem a nada. As segundas, não são famosas na aparência, mas depois de as provar, é de comer e chorar por mais.
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(PS: Posto isto, não necessito elaborar sobre a resposta à questão que coloquei aqui, no seguimento do desafio colocado pelo Joaquim aqui).

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