02 outubro 2008

mete Estado



Quando o processo espontâneo do mercado desemboca, não numa ordem como Hayek sustentava, mas numa desordem, como agora se vê, não é possível continuar a acreditar nos poderes ilimitados da mão invisível.

Na minha discussão anterior relativamente ao risco, um problema importante é o de saber se quem assume riscos, e deles colhe esperadamente benefícios, são também aqueles que, no caso de as coisas correrem mal, suportam as perdas. No falar dos economistas, trata-se de saber se existem ou não externalidades negativas na assumpção de riscos.

Se o Sr. Smith investir a sua fortuna em produtos financeiros de risco e a perder, não resulta daí nenhum mal, excepto para o Sr. Smith. O problema é diferente quando a especulação é praticada a nível institucional por instituições tão grandes - como a Goldman Sachs, a Morgan Stanley, a UBS, etc. - que não podem ser deixadas ir à falência sem provocarem verdadeiras catástrofes sociais. Neste caso, é preciso controlar os riscos que estas instituições assumem.

Apesar de o Estado ser uma instituição reconhecidamente ineficaz eu não conheço outra menos ineficaz para desempenhar esta função de polícia. As empresas privadas de auditoria e as agências privadas de rating falharam rotundamente na defesa do interesse público quer durante a bolha bolsista do início desta década (vg., caso Enron) quer na actual crise financeira. Sendo pagas pelas empresas que são supostas controlar, acabam por ser vítimas de um processo de captura, defendendo os interesses de quem lhes paga, e não do público a quem eram supostas servir.

Mesmo que o Estado seja a mais ineficaz de todas as instituições, é ele que põe o dinheiro, como agora se vê, quando as coisas correm mal aos grandes especuladores institucionais privados. Esta razão é suficiente para que o Estado tenha uma palavra a dizer na gestão destas instituições, designadamente impondo limites à assumpção de riscos que não podem ser ultrapassados, e zelando vigorosamente para que esses limites sejam cumpridos.

A discussão acerca de certos autores liberais como Mises, Hayek, Rothbard, etc., chegou a Portugal com trinta anos de atraso. Fazia-se nas universidades norte-americanas no final da década de setenta, princípios da década de oitenta. Em Portugal, esta discussão tem-se reduzido geralmente à futilidade do mete Estado, tira Estado, mete Estado, tira Estado. A actual crise financeira veio sugerir que se trata agora de um caso de mete Estado.

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