05 março 2008

"Uma Proposta de Reforma Conceitual", de Miguel Cadilhe


A recente troca de palavras entre Miguel Cadilhe e o ministro das Finanças Teixeira dos Santos é uma polémica à portuguesa. Tudo começa em matérias de facto – a substância da discussão. E, depois, incendeia-se o debate com questões de forma. Nesse aspecto, Miguel Cadilhe é um mestre. Por aquilo que li nos jornais, Cadilhe fez uso de diversos conceitos. Mencionou o termo “PIB” ao qual juntou a expressão “produto real contra o produto potencial” (Diário Económico de hoje, pág. 11). E concluiu que Portugal está numa grave recessão há vários anos. Por seu turno, Teixeira dos Santos afirmou que a opinião de Cadilhe é “alarmista”, “gratuita” e que carece de “fundamentação técnica”. Afinal de contas, recordou o ministro, uma recessão caracteriza-se por dois trimestres consecutivos de crescimento negativo. Ora, Portugal está a crescer a 1,8% - de acordo com os últimos números avançados pelo governo.

Posto isto, devo dizer que, embora Teixeira dos Santos esteja tecnicamente correcto, tenho bastante simpatia pela opinião de Miguel Cadilhe. A sua afirmação reflecte a realidade que as famílias portuguesas sentem genericamente. De facto, o fraco crescimento registado em Portugal não é suficiente para acomodar a taxa de inflação que por cá se sente. É, aliás, por essa razão que alguns países defendem hoje que o conceito académico de “recessão” deveria ser revisto, de modo a contemplar também a evolução dos preços. Em muitos países, por exemplo nos Estados Unidos, defende-se que qualquer crescimento do PIB abaixo de 2% constitui, na prática, recessão. Ou seja, Cadilhe teve razão na substância dos argumentos, mas mais uma vez falhou na forma da comunicação. Aquele enrolar de termos técnicos inviabilizou a compreensão da sua mensagem, o que em Portugal é fatal. Se eu fosse seu assessor, ter-lhe-ia sugerido um guião para evitar as armadilhas de expressão nas quais cai repetidamente. Porque, nessa matéria, este governo não perdoa.

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