17 fevereiro 2008

G7 (*)



O G7 reuniu-se no passado fim de semana. Os ministros das finanças dos sete países mais industrializados do mundo encontraram-se no Japão, em Tóquio, e debateram as questões mais candentes que afectam a economia mundial. Segundo os relatos, a conversa foi a do costume. Baterias carregadas sobre a China. Sobre os países produtores de petróleo. E mensagens de algum conforto por parte dos bancos centrais, que também se fizeram representar. Enfim, há muito que as reuniões do G7 são eventos enfadonhos e irrelevantes. Confesso que não sei por que é que se lhes dá tanta importância. Na minha opinião, servem um único propósito: atacar os que não estão alinhados.

Os leitores que acompanham esta rubrica sabem que, frequentemente, gosto de criticar a China. A mania da réplica e da pirataria, enraizada na cultura empresarial chinesa, é um fenómeno que me incomoda em particular. Contudo, a China começa a ter as costas largas de mais. É apontada como a causa de tudo e mais alguma coisa. Se não é a pirataria, é a divisa. E se não é divisa, são os subsídios internos ao consumo de combustíveis. Assim não vale. Esta reunião do G7 foi, por isso, um lamentável exercício de negação de responsabilidades próprias. Os problemas que existem hoje nos mercados de capitais foram criados pelos países ocidentais. Em especial, através das políticas demasiado permissivas que vigoram nos créditos a particulares e institucionais. Infelizmente, estamos a ter o que merecemos.

Na verdade, se há alguma observação a fazer à China, no domínio da recente crise dos mercados financeiros, é a de que tem desempenhado um importante papel ao não desequilibrar ainda mais a já de si delicada situação da economia norte-americana. Nos últimos anos, os défices norte-americanos têm sido financiados no exterior, em particular na Ásia. Chineses, japoneses e, mais recentemente, os países árabes próximos da América, têm sido os principais investidores em títulos de dívida pública norte-americana e afins. E, apesar da queda estrutural registada na cotação do dólar desde 2002, não têm vendido, de forma significativa, títulos cotados em dólares. Estima-se, por exemplo, que cerca de 70% das reservas internacionais chinesas estejam cotadas em dólares. Agora, imagine-se se a China desatasse a vender esses títulos. O colapso de Nova Iorque seria imediato. Pior que o 11 de Setembro.

Os próprios fundos soberanos destes países têm contribuído para contrabalançar as enormes amortizações incorridas pelos grandes bancos de investimento norte-americanos. Por isso, apontar armas à China – ainda para mais, na velha e desgastada questão do yuan – constitui um discurso profundamente hipócrita. A China tem a economia a crescer a 10% ao ano, produz mais do que consome, aforra mais do que o montante em que se endivida, portanto, tem o direito de fazer o que bem lhe apetecer desde que respeite os seus parceiros internacionais. Não é o yuan, valorizado em mais ou menos 5 pontos percentuais, que vai fazer a diferença. E também não será a abolição dos subsídios internos, atribuídos pela China, sobre os preços dos combustíveis – prática utilizada por Portugal até há alguns anos atrás – que melhorará, de forma material, a competitividade das empresas estrangeiras que para lá queiram exportar.

O que o Ocidente deve fazer, em vez de se desculpar da forma que mais lhe convém, é analisar e corrigir os profundos desequilíbrios existentes no seio da sua sociedade. Primeiro, decidir se quer manter o modelo social ou se vai competir no mercado internacional contra os tigres asiáticos. E em que domínios o fará. Segundo, rever o fenómeno do crédito e actuar sobre os rácios de capital dos bancos que emprestam dinheiro a mais. Porque o segredo da China é, precisamente, a sua taxa de aforro. Só o G7 é que não vê isso. Aliás, o próprio G7, através de palavras excessivas e mal medidas, é o primeiro a dar o mau exemplo.

(*) : publicado no semanário "Vida Económica" a 15 de Fevereiro 2008

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