É do senso comum que o pensamento conservador é «pessimista» e o liberal «optimista». Esta asserção é, quanto ao conservadorismo, uma presunção, e quanto ao liberalismo uma dedução. Em ambos os casos trata-se de uma atitude filosófica e antropocêntrica, com inevitáveis consequências políticas. E esta distinção é, segundo também a opinião comum, a linha de fronteira entre conservadorismo e liberalismo. Não será tanto assim, como veremos.
De facto, os conservadores costumam ter sobre o género humano uma visão pouco benévola, em boa medida fundada nas raízes cristãs do seu pensamento: o homem é pecador e só se redime em Deus, tendendo naturalmente para o mal caso não seja superiormente orientado. Daí resulta a convicção de que os homens não podem viver socialmente em liberdade plena, sem limitações que lhes sejam impostas verticalmente. Esses limites à liberdade individual terão a moral por critério e o Estado (o governo) por executor. A necessidade do Estado justifica-se, assim, para os conservadores, como forma de assegurar a convivência social. Os conservadores são, como é sabido, hobbesianos.
Já os liberais acreditariam que, em estado de natureza, os homens se conseguem entender, não obstante admitirem que não só isso possa não suceder, como até que eles possam violar os direitos alheios, isto é, a liberdade dos outros. Por essa razão, apenas por essa razão, aceitam os liberais que se institua, por contrato social, um governo que os represente e os defenda, a si e aos seus direitos. Os liberais são, como é sabido discípulos de Locke.
Em traços largos, nisto consistiria o fundamental do pessimismo conservador e do optimismo liberal. Só que os raciocínios estão incompletos e, se os analisarmos melhor, veremos que um pouco mais adiante se invertem as posições.
Porque, os conservadores são pessimistas quanto à generalidade do género humano, mas tornam-se subitamente optimistas quanto aos homens que vão desempenhar as funções de soberania. Parece que, uma vez no governo, os homens passarão a ser honestos, probos e imparciais, de modo a poderem tratar do «interesse comum» de todos, sem interesse pessoal. Santa ingenuidade, é caso para dizer! Em contrapartida, os liberais não querem um Estado amplo, um governo com muitas funções e poderes, exactamente por desconfiarem dos homens, sobretudo dos homens que dispõem de soberania exercendo-a sobre outros. Ao invés dos conservadores, face ao homem político, ao homem dotado de soberania, os liberais são muito mais pessimistas.
De modo que o critério do pessimismo/optimismo como bitola para distinguir conservadores e liberais, não serve. Como, até, talvez seja uma distinção verdadeiramente inexistente. Em qualquer dos casos, não existem falsas ingenuidades sobre a natujreza humana. Na verdade, o que os liberais dizem é que os homens, não sendo naturalmente bons nem maus, saberão tratar melhor dos seus interesses sem intermediários. Mas não duvidam que sejam necessárias instituições que lhes refreiem a ambição e os impeçam, ou castiguem, de violentar os direitos e a liberdade alheia. Nada, por isso, que seja incompatível com a existência de intituições e da soberania, tal como defendem os conservadores. Mas pouca, o mínimo possível, se faz favor.
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