Pela segunda vez em menos de seis meses, eu julgo ter dado confirmação empírica no universo da blogosfera à tese de que é possível criticar livremente a cultura cristã - católica ou protestante - e, ainda assim, esperar receber em troca argumento racional. Pelo contrário, qualquer crítica à cultura judaica, por mais leve que seja, ainda que racional e fundada, encontra do outro lado e em massa, não argumento racional, mas as reacções mais emotivas e irracionais - insultos, humilhações, acusações, assassínios de carácter, tentativas de silenciamento, até ameaças. Voltou a acontecer nos últimos dias com dois posts que escrevi sobre os judeus e que, se dissessem respeito a cristãos - protestantes ou católicos, sobretudo a estes - teriam passado despercebidos, ou até recebido apoio intelectual.
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Uma cultura, como a judaica, que sobrevive há cerca de cinco mil anos, pequena e dispersa pelo mundo, não pode tolerar críticas, ainda que racionais e fundadas, aos seus valores fundamentais. Não as pode tolerar de fora, menos ainda de dentro. Um intelectual judeu nunca critica a cultura judaica e, se ousa fazê-lo, está destinado a pagar um preço elevadíssimo. Baruch Spinoza é, obviamente, o exemplo clássico. Mas existem exemplos recentes. Pelo contrário, os intelectuais cristãos - especialmente os católicos - comprazem-se em denegrir a sua própria cultura sem que nada lhes aconteça.
A crítica, ainda que racional e fundada, enfraquece, e a cultura judaica, pequena nos números e dispersa pelo mundo, nunca se pôde permitir o luxo de enfraquecer a partir de dentro. Por isso, ela é radicalmente intolerante para com aqueles que, de entre os seus, ousam criticá-la nos seus pilares essenciais. Liberdade de auto-crítica é um luxo que só uma cultura como a cristã, por força dos seus números e da sua extensão, se pode permitir. Esta liberdade de auto-crítica, como todos os luxos, tem contribuído para enfraquecer o cristianismo, e no caso da corrente católica, tem-na enfraquecido muitíssimo.
Se a crítica endógena não é tolerada no judaísmo, a crítica exógena também não o pode ser, e pelas mesmas razões. Trata-se ainda de um proibição possuindo um carácter absoluto. Ora, as proibições não se negoceiam nem se discutem racionalmente, impõem-se pela força - e daí a barragem de insultos, ameaças, assassínios de carácter, tentativas de silenciamento,etc., que constituem a reacção distintiva do judaísmo a qualquer crítica exterior.
Pelo contrário, a supremacia numérica do cristianismo e a sua extensão permitem amortecer e diluír qualquer crítica aos seus valores essenciais. Daí a maior tolerância que o cristianismo exibe perante a crítica externa, recebendo-a, em geral, não com insultos, ameaças ou assassínios de carácter, mas com o privilégio do argumento racional.
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