29 novembro 2007

exemplar

A entrevista de Pedro Marques Lopes a Zita Seabra sobre o 25 de Novembro e o envolvimento da então dirigente do Partido Comunista nesses acontecimentos, que o 31 da Armada editou, é verdadeiramente impressionante. Não propriamente pelos acontecimentos relatados, mais ou menos do domínio público, mas pela lição de História viva do nosso país para que ele nos transporta.

Encurtando explicações: Zita Seabra, hoje uma mulher tranquila, social e profissionalmente bem sucedida, politicamente integrada num partido conservador do qual é, de resto, dirigente, conta-nos que, há trinta anos, já uma mulher feita, racional e consciente, aguardava ordens e armas para ela e os militantes comunistas que controlava (ela era uma «controleira», porventura a mais importante, da estrutura juvenil portuguesa do Partido Comunista), fazerem uma revolução comunista e instalarem um regime de tipo cubano em Portugal. Dessa revolução teriam resultado, sem dúvida alguma, muitos mortos e uma tragédia de dimensões muito difíceis de calcular. O país não teria evitado uma guerra civil e, caso a «revolução» tivesse triunfado, não sabemos por quantos anos teríamos tido uma ditadura comunista.

O que impressiona em tudo isto é, repito, a lição de História viva do nosso país que dali se retira. Não conheço muitas democracias europeias que tivessem resolvido, de forma tão exemplar como a nossa, as suas tensões interiores, superado os seus traumas e dramas humanos, e passado uma esponja sobre o pior do seu passado recente, de modo a que as pessoas das mesmas gerações que viveram e protagonizaram os acontecimentos mais dramáticos, continuassem a viver tranquilamente umas com as outras. Em Espanha, em Inglaterra, em Itália, na Alemanha ou em França, dificilmente Zita Seabra seria o que é hoje, independentemente dos seus muitos e reconhecidos méritos e qualidades pessoais e profissionais.

Num período de muito poucos anos, o nosso país absorveu e sublimou os traumas do Estado Novo, da Guerra Colonial, da Descolonização e do PREC. Portugal é, de facto, um país tolerante, onde, apesar do Estado e os seus sucessivos governos não terem ajudado, as pessoas se conseguiram entender entre si. O que demonstra que, apesar de tudo, os indivíduos são quase sempre mais sensatos do que as instituições que os governam.

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