13 outubro 2007

ditadura

A estabilidade política que a Europa Ocidental atingiu nos últimos anos é um fenómeno recente na sua longa história, e que contradiz a sua normalidade. Não apenas entre os vários Estados que a compõem, mas e sobretudo, dentro dos próprios países.

Até há umas décadas atrás, o procedimento mais comum para resolver as crises políticas acentuadas era o da substituição violenta dos governantes e da classe política que lhes estivesse associada. O golpe de Estado, o pronunciamento militar, o golpe palaciano, tudo isso traduz meios acidentados, mas muito comuns, de modificação do poder político vigente nos países europeus. Até à década de 50 do século passado, a superação das crises internas passou quase sempre pela instauração de regimes despóticos ou autocráticos, isto é, de ditaduras. Depois desses anos, com o sucedido nas duas guerras mundiais da primeira metade do século, alguns países compreenderam que esse não era o melhor caminho e encetaram outro percurso, conhecido, ao tempo, como a Comunidade Económica Europeia. A ideia era simples, tem as suas raízes no pensamento liberal clássico, e foi muito bem sucedida: aproximar os povos através do livre-comércio, e pacificar desse modo os países. Portugal, como alguns outros Estados europeus periféricos, resistiu ainda alguns anos à ideia, mas lá acabou por a aceitar. Hoje, a pax comunitária domina o continente e a ditadura não passa de uma miragem longínqua.

Não fosse esse novo Império Romano do Ocidente e, muito provavelmente, a crise económica em que vivem alguns dos seus países, entre eles Portugal, seria não só muito mais profunda, como já teria tido inevitáveis consequências políticas para o regime democrático. E, por falar no velho Império, há que lembrar que a figura da «ditadura» foi criada no regime da Republica Romana que o antecedeu. Tratava-se de uma magistratura ordinária, isto é, que só era activada em momentos de perigo interno ou externo muito sério, que durante o período máximo de seis meses fazia suspender todos os mecanismos constitucionais em vigor, de modo a tentar ultrapassar a crise pela absoluta centralização do poder. Este sistema, que em boa medida explica a sobrevivência da República durante mais de quinhentos anos, tem um pressuposto desagradável: que o exercício separado do poder pode levar à decadência e ao conflito, e que só o seu exercício centralizado e até despótico, poderá repor a ordem. É uma ideia que desde sempre ensombrou as democracias, e que elas não conseguiram ainda refutar por inteiro. Não fosse a pax comunitária que, em muito boa medida, nos dirige e tutela, provavelmente Portugal já teria dado mais uma vez razão aos velhos arautos da desgraça.

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