01 setembro 2007

não vê no estado

Num post anterior, sob o título pura demagogia, contestei a tese de que a redução do peso do Estado na sociedade é necessariamente um factor de crescimento económico e de desenvolvimento económico e social. Esta tese é frequentemente avançada por alguns sectores de opinião que se afirmam liberais, especialmente entre economistas.

Trata-se, porém, de uma derivação judaica da prossecução do ideal cristão de liberdade - uma derivação cultivada modernamente pelo economista Ludwig von Mises (1881-1973) e prosseguida a outrance pelo seu discípulo Murray Rothbard (1926-1995) até ao ponto da anarquia. Na realidade, na tradição cristã de liberdade, a atitude dos cidadãos em relação ao estado não é uma atitude de adversidade, mas uma atitude de independência.

Aquilo que atraiu a suspeição e a hostilidade do império romano em relação ao primeiros cristãos foi a insistência por parte destes de que a sua fidelidade a Cristo os impedia de participar na religião civil do estado, a qual envolvia a veneração do génio ou do espírito do imperador. A sua recusa frequente em participar no serviço militar tornou-se um agravo adicional, um sinal de independência perniciosa, desleal e potencialmente perigosa fora das esferas normais de controlo social. (1)

O cristianismo foi a primeira religião a afirmar a sua independência em relação ao estado. Durante mais de 300 anos, muito antes de ela própria vir a tornar-se a religião do estado no império romano (396 dC), a igreja cristã tinha já desenvolvido a sua própria organização e as suas próprias leis sem a ajuda do estado e sem a intromissão do estado, e até as suas próprias forças autónomas de defesa. A igreja católica foi, provavelmente, a primeira instituição da história da humanidade independente em relação ao estado e a fazer face ao estado. Este foi um facto de imensa importância para a Europa e não surpreende que tenha sido na Europa, e não noutras partes do mundo, que floresceu o ideal de liberdade. (2)

Esta tradição, a igreja ainda hoje mantém. Na realidade, certas partes da doutrina da igreja parecem extraídas de um manual de sublevação política. Porém, ao demarcar muito claramente a linha que o estado não deve trespassar - a césar o que é de césar, a Deus o que é de Deus - e excepto quando ele a trespassar, a tradição cristã de liberdade não vê no estado um inimigo da sociedade. Pelo contrário, vê nele uma instituição espontânea e necessária à preservação da liberdade.
(1) Andrew Walls, "Christianity", in John R. Hinnels (ed.), Living Religions, London: Penguin, 1997, p. 65.
(2) Paul Johnson, The Quest for God, New York: HarperCollins, 1996, pp. 105-106.




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