04 julho 2007

dormindo com o inimigo

O Estado é um mal, como reclama o Adolfo Mesquita Nunes no A Arte da Fuga? Sem dúvida que sim! Ele tira mais, muito mais, aos cidadãos que contratualizaram os seus serviços do que aquilo que lhes dá, explora-os indecorosamente, maltrata-os e escraviza-os, e, pior do que tudo, fá-lo em nome de valores de justiça social em que as suas oligarquias verdadeiramente nunca acreditaram, quando o que para elas está em causa é somente perpetuarem-se no poder que ele lhes confere.
O Estado é, por conseguinte, uma perigosa ilusão e uma miragem assassina. Perigosa para o indivíduo e assassina para a liberdade. Porém, ele é uma instituição. A mais coeva instituição política, ao ponto de se confundirem os dois conceitos: a política e a sua expressão organizativa mais comum. Sobre o Estado escreveram-se, desde a Antiguidade Clássica aos dias de hoje, tratados, manifestos, ensaios, proclamações, um número incontável de folhas de papel. Por ele e em seu nome foram feitas revoluções, morreram e morrem diariamente pessoas em todos os cantos do mundo. A criação dos Estados italiano e alemão no século XIX, dos Estados africanos e asiáticos no século XX, ou até mesmo do Estado basco nos nossos dias, provocaram e provocam paixões que frequentemente levam à morte de milhares de seres humanos.
O Estado não serve, o Estado não presta, o Estado desagrada? Mas como, se hoje mesmo, quando é visível à saciedade que o Estado prejudica mais do que beneficia, a maioria das suas vítimas continua a exigir que, quando e onde ele falha, ele se reforce e aumente a sua presença? Não é isso que, todos os dias, pedem os manifestantes prejudicados pelo governo, que dizem os ouvintes e participantes dos foruns radiofónicos e televisivos, que proclamam os simpatizantes e dirigentes partidários, sem excepção, da extrema-esquerda à extrema-direita, passando pelo PS, pelo PSD e pelo CDS?
Ignorá-lo, portanto, remetendo-o para a prateleira das abjecções que nos repugnam, evitando perceber a sua natureza e o fascínio que exerce sobre as suas vítimas, é a mais perigosa de todas as atitudes, e certeamente também aquela que mais lhe convém.

6 comentários:

Anónimo disse...

Excelente!

AMN disse...

Esta questão parece-me já substancialmente diferente daquela que foi colocada pelo Pedro Arroja, que parecia arrastar o momento fundacional do Estado para os nossos dias.

Não sou talvez a melhor pessoa para responder porque estou longe de ser um radical anti-Estado. Sou até muitas vezes acusado de ser demasiado brando ou contemporizador com a realidade existente.

O meu post comento que o Estado é um mal porque não permite, a quem não quer a ele estar ligado, sair da sua esfera. Trata-se, aqui tão somente, de permitir um modelo em que permita a liberdade de escolha e que acomode essa liberdade de ecsolha.

Numa coisa estamos de acordo. E tenho defendido isso várias vezes, muitas com incompreensão: o discurso de reforma do Estado deve ser um discurso do possível, do que pode e deve ser feito, e não de utopias ao estilo dos amanhãs que cantam.

Um grande abraço,
a.

Eduardo disse...

Bom dia. O que o leva a pensar que a ausência de Estado não se traduz nas mesmas mortes, desgraças, etc? Este post é a negação de toda a História da humanidade. Devemo-nos organizar por tribos? Os membros de uma sociedade não se devem organizar? O Estado não é uma instituição que resulta da vontade do povo? (Desculpe referir-me a esses nojentos do povo, que têm a mania de falar sobre o aeroporto) Não esperava tanta frivolidade da sua parte. Devem ser influências. Recentes. Melhores cumprimentos.

CN disse...

Se analisarmos o suposto "mal menor" constituido pelos Estados, dificilmente poderiamos caracterizar como mal menor os milhoes de mortes de todas as guerras e revoluções passadas por causa da alguém disputar o monopolio sobre a violencia sober uma região (definição de Estado).

Não consigo conceber que mesmo que fosse verdade que na ausência desse monopolio existiriam conflitos permanentes (coisa que eu como outros disputam), nenhum conflito ente pessoas/grupos alcancaria nem de perto, todo o assassinio e roubo em massas possivel pela centralização do poder da violencia em tais monopolios.

A suposta ordem interna com que o Estado serve as pessoas (e não é demais referir que não existe qualquer contrato civil que legitime um Estado) dando-lhes paz, é na verdade uma paz que está semrpe a ser posta em causa.

O Estado é um mero status quo que a história não se cansa de por em prova.

Portanto, o desejo de um Estado (ainad que democratico) é como a população que viveu sobre o fascismo ou comunismo. Uma boa parte dela não se lhe opos e até nem concebia viver de outra forma.

O Estado é totalitário por natureza e apenas uma questão de grau.

Depois, se o Estado é necessário (como monopólio da violência ) porque é que não existe um Estado Mundial?

Ou defendem um Estado Mundial ou caiem em contradição.

Rothbard tem toda a razão filosófica do lado dele.

PS: Já agora, não tenho noticias que a ICAR defenda um Estado Mundial. Por isso aceita a multiplicidade do Direito e do uso da violência.

CN disse...

Por vezes, os supostos opositores da teoria ancap parecem querer defender o seguinte:

"Mesmo que seja possivel contratualizar de forma civil o serviço de segurança e de arbitragem de conflitos, eu, porque não sou ancap, desejo que uma entidade assuma esse monopólio nem que seja pela violência esmagando qualquer outra entidade que pretenda oferecer os mesmos serviços.

Essa entidade poderá recorrer a todo o tipo de violência para se impôr como monopólio territorial".


Pois... não parece lá grande coisa.

Até porque é precisamente pela competição para alcançar esse monopólio territorial que todas as guerras e revoluções se fazem.

E a guerra é o estado puro de ausência do Direito.

Hobbes propoem o Estado para acabar com o estado da natureza, mas depois é o poder que o Estado confere que provoca os estados extremos de ausência de qualquer noção de direito.

Será que me é permitido acabar com ... QED?

Eduardo disse...

O liberalismo e o comunismo têm como ponto de partida e premissa fundamental uma fé inabalável na natureza humana. Esta, porém, faz com que ambos falhem, porque não está isenta de defeitos, estimulando-os até. É por isso que existe o Estado. É por isso que todos os povos têm Estado. Mesmo os que não têm desejam-no.