18 junho 2007

a vidraça quebrada


A Lei 19/2003, de 20 de Junho, aprovada na Assembleia da República sob a égide da maioria parlamentar do PSD/CDS, ainda na liderança de José Manuel Durão Barroso, estabelece o regime jurídico do financiamento dos partidos políticos e das campanhas eleitorais, e, diga-se, é de um absurdo completo.
A lei estabelece um regime misto de financiamento, privilegiando as subvenções públicas aos subsídios e patrocínios privados. Quanto a estes últimos, estabelece limitações inconcebíveis e irrealistas, tais como a proibição dos donativos de pessoas colectivas nacionais ou estrangeiras (artigo 8º, nº 1). O objectivo é evidente: evitar que os partidos políticos colectem dinheiros de entidades, nomeadamente de empresas, a quem fiquem a dever eventuais favores a compensar num futuro governo ou câmara municipal.
A intenção do legislador é compreensível e não pode dizer-se que fosse má. Mas os resultados estão à vista e são péssimos. Porque, nestas coisas do intervencionismo estatal, como lembrava Fredéric Bastiat na sua célebre alegoria da vidraça quebrada, existem sempre dois tipos de efeitos: os que se vêem e os que não se vêem no momento em que é tomada a decisão. A intenção do decisor político é uma, o que resulta da sua decisão é frequentemente coisa muito diferente.
Neste caso, ninguém de bom senso acredita que as campanhas eleitorais dos grandes partidos políticos para as eleições legislativas e autárquicas custam o que eles declaram e que são sustentadas dentro dos limites que a lei prevê. O que, imaginando-se quanto elas custam realmente e desconhecendo-se a verdadeira origem dos financiamentos, origina as piores suspeições e desconfianças. Ou seja, a Lei nº 19/2003 nada tem a ver com a realidade. E, quanto a esta, desconhece-se onde começa e acaba: ninguém sabe ao certo que ligações e dependências existem entre os nossos partidos e os grupos económicos e empresariais.
Uma lei que liberalizasse, de facto, esta matéria, permitiria uma melhor identificação dos interesses em jogo no exercício dos poderes soberanos, evitaria suspeições abusivas, como poderia explicar melhor algumas decisões tomadas que, ainda que fossem impulsionadas por lobbys, não teriam que ser consideradas ilegítimas. Assim, ninguém sabe.

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