26 junho 2007

a democracia mata a liberdade

Alexis de Tocqueville, provavelmente o maior estudioso da democracia, nunca se convenceu que a democracia fosse um regime político de aplicação universal e com os mesmos benefícios que ele observou na América.

Depois de muita hesitação e já quase no final da sua obra clássica, ele declarou que a viabilidade da democracia num país dependia críticamente da sua cultura (moeurs).

Alexandre Herculano, na minha opinião o mais ilustre liberal português dos tempos modernos, era um adversário da democracia, e não é difícil perceber porquê. A noção que Herculano possuía da liberdade não era, obviamente, a noção tirânica segundo a qual a liberdade é o direito de cada um a fazer aquilo que quer (apenas limitado pelo reconhecimento de igual direito a todos os outros).

Para Herculano, um homem livre é aquele que pensa, fala, decide e actua de acordo com a sua consciência, e independentemente da forma como pensam, falam, decidem e actuam os outros - todos os outros.. Daí as alusões recorrentes na obra de Herculano segundo as quais "a liberdade é o eu moral" ou "a liberdade é a verdade da consciência, como Deus". Esta é também a noção de Lord Acton, embora para além da coincidência de serem contemporâneos e ambos historiadores, não exista evidência de que alguma vez tivessem tido conhecimento um do outro e da suas respectivas obras.

Numa democracia parlamentar, as pessoas agrupam-se em partidos para conquistar o poder. Os políticos democratas são os primeiros a perder a liberdade e isso constitui um péssimo exemplo para toda a população. Porque, a partir de agora, eles têm de dizer e fazer, não aquilo que eles consideram que está certo, mas aquilo que presumem que os eleitores querem ouvir e querem que seja feito - se é que desejam captar votos e ser eleitos. Eles passam a estar sujeitos à tirania da opinião pública.

A um nível mais modesto, um membro de um qualquer partido em democracia perde também a sua liberdade. Entre aquilo que está certo e a linha oficial do partido é melhor que ele se submeta a esta última, caso contrário será expelido. Por isso, um homem livre não tem lugar na política partidária de um regime democrático. E qualquer homem livre que tente fazê-lo acabará inevitavelmente por ser rejeitado, a menos que aceite matar a sua liberdade.





8 comentários:

PintoRibeiro disse...

A Democracia e a Liberdade são conceitos muito diversos.
Gostei.
Boa tarde.

Anónimo disse...

Excelente texto. A reflectir.

A vontade das massas é realmente uma ameaça real à liberdade.

Anónimo disse...

Muito bom.

CN disse...

O problema não é o facto de existirem decisões colectivas.

Na sociedade civil (nas empresas, associações e condomínios) existe democracia respeitando os direitos naturais (e aqui parece-me que o PA tende a subestimar que sem direitos naturais não existe sequer noçao de Direito).

O problema é a democracia politica, a qual não se baseia em relações civis (de propriedade como nos condominios, etc).

O voto confere o direito de cada um dispor de todos os direitos dos terceiros.´

E isso é que o Liberalismo tem de combater.

Anónimo disse...

Esta abordagem lembra-me um conto de Afonso Lopes Vieira: o cão de guarda não se cansava de elogiar a comida, casota, boa-vida, para o cão vadio, quando este lhe perguntou para que servia então a coleira.

Anónimo disse...

Recordar o Arroja que esquenceu-se de Salazar nas suas ilustres referencias anti-democratas!

Ai, o puto Alzheimer ja ameaçador!

Anónimo disse...

O Arroja tem um problema com a historia e os personagens da historia que por ela andao o que lhe escapam a sua divagaçoes (porque ele nao é historiador).

E un erro nao pequeno. Situar a historia no seu contexto. No caso de Tocqueville que ele viu a America de 1834.
No caso de seu acompanhante que era o Marqués de Lafayette. Entao, ambos dois aristócratas.
Paresce como que sao questaos irrelevantes, mais nao sao. Caro Arroja!. Para um bom historiador esto nao sería pura anécdota. Pois nao!

Dois franceses
"Eu confesso que na América eu vi mais do que a América; eu vi a imagem da democracia mesmo, com suas inclinações, seu caráter, seus preceitos, e suas paixões, o suficiente para aprender o que devemos temer ou o que devemos esperar do seu progresso."


Alexis de Tocqueville, 1834
Marquês de Lafayette (1757-1834)
Os Estados Unidos da América devem muito a dois franceses. Por sinal ambos aristocratas e também muito jovens. Um deles, o Marquês de Lafaytte, aos 20 anos de idade, por iniciativa própria, navegou para América do Norte em 1777 para ajudá-la na Guerra de Independência contra a Grã-Bretanha. Não só isso. De volta à França, em 1779, convenceu o monarca Bourbon a auxiliar os americanos. O outro, Alexis de Tocqueville, lá aportou aos 26 anos para uma visita de estudos, em 1831, empunhando mais tarde a pena para registrar em livro a melhor descrição (até hoje considerada insuperável), do funcionamento do regime político norte-americano: La Démocratie en Amerique (A Democracia na América, cujo 1º volume é de 1835 e o 2º é de 1840, com quase mil páginas).
É um desses estranhos paradoxos da história das idéias de que dois ricos herdeiros de sangue-azul viessem a sentir-se de alguma forma fascinados pelo que a América simbolizava naquela época. Nada havia naquela época mais oposto à casta deles do que a democracia americana. Tocqueville, por exemplo, era bisneto de Malesherbes, o advogado de defendera o rei Luís XVI na Convenção em 1794, quase sendo decapitado junto com o soberano condenado.

Anónimo disse...

"O povo tinha a liberdade e quis a licença; tinha a justiça e quis a iniquidade: o povo perecerá." Mas é bom olhar o autor da "Voz do Profeta" como uma consciência radicada naquele movimento social que opera o "milagre económico" (de A.Peyrefitte).