(Continuação daqui)
12. O juiz-acusador
Aquilo que mais indignará um espírito norte-americano e genuinamente democrático no julgamento de Jair Bolsonaro é a figura do juiz-acusador protagonizada por Alexandre de Moraes. É por isso que ele é o principal visado nas sanções impostas pela administração Trump ao Brasil relacionadas com este julgamento.
Num regime político autoritário, a justiça é um braço do poder executivo que, entre outros, tem como objectivo eliminar os opositores ao regime. É uma justiça parcial que está sempre do lado do poder e à caça dos opositores. Era assim a justiça inquisitorial. Quem não fosse católico ou obediente ao poder absoluto do rei seria perseguido e seguramente condenado. Foi este sistema de justiça que Portugal levou para o Brasil, e que ainda hoje prevalece em ambos os países.
Portugal tornou-se uma democracia há 50 anos, e o Brasil há 40, mas o sistema de justiça em ambos os países permanece o sistema de justiça próprio de um Estado autoritário que na sua última versão em Portugal foi a do Estado Novo e no Brasil a da ditadura militar. Uma das figuras mais salientes deste sistema de justiça autoritário é a do juiz-acusador, o juiz que julga sobre a sua própria causa.
A democracia é um sistema de regras, cabendo ao poder judicial administrar a aplicação dessas regras. A democracia é um jogo em que cada um é livre de prosseguir os fins que entende na vida, desde que obedeça às regras que são iguais para todos. Os juízes são os árbitros deste jogo, e aquilo que se espera de um árbitro é, em primeiro lugar, a imparcialidade.
Ao juiz Alexandre de Moraes falta este atributo essencial de uma justiça democrática, como já havia faltado ao juiz Sérgio Moro que condenou Lula da Silva. Alexandre de Moraes conduziu a acusação e depois é chamado a julgar sobre a sua própria acusação. Será que vai dizer que o réu está inocente? Não, seria contradizer-se a si próprio.
Aos olhos de um democrata, isto não é julgamento nenhum. É jogo sujo, é batota, é uma caça às bruxas, como lhe chamou o Presidente Trump.
Os brasileiros que não se penalizem em excesso. Em Portugal, eu próprio, há poucos anos fui condenado por um juiz-acusador. Sabendo que ele lia o blogue, poucos dias depois da condenação, enviei-lhe uma mensagem: "Um verdadeiro juiz não acusa (nem defende). Um verdadeiro juiz julga e, em seguida, absolve ou condena" (cf. aqui). Mais tarde, expliquei a miséria da condenação (cf. aqui).
Com a condenação de Bolsonaro e vários militares de alta patente, o Brasil tornou-se um sério candidato a um golpe de Estado militar apoiado pelos EUA. Um país consegue conviver com a fome, mas dificilmente consegue conviver com a injustiça. Entre a ditadura da toga e a ditadura militar, a ditadura militar é bem capaz de ser a menos má.

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