A Hora da Autocrítica Liberal
Sem reconhecer os erros de 2020-2025, os liberais clássicos não têm autoridade moral para travar o populismo
Durante décadas, os liberais clássicos foram os guardiões naturais da liberdade individual, da economia de mercado, da separação de poderes e de uma ordem constitucional baseada no primado da lei. Foram eles que, com maior ou menor coerência, sustentaram o edifício das democracias liberais após a Segunda Guerra Mundial. Mas algo correu mal. Muito mal.
Entre 2020 e 2025, esses mesmos liberais — ou pelo menos as elites que se reclamavam como seus herdeiros — falharam gravemente. E, sem uma autocrítica clara e pública, não terão qualquer autoridade para se erguer contra os populismos que agora crescem em todo o Ocidente.
A pandemia da COVID-19 foi o primeiro grande teste. E o liberalismo institucional colapsou. Os Estados impuseram confinamentos sem precedentes, censuraram vozes dissidentes, encerraram debates científicos e promoveram produtos farmacêuticos experimentais como "seguros e eficazes" sem dados robustos de longo prazo. As liberdades individuais foram suspensas com uma ligeireza chocante. Onde estavam os liberais?
Alguns estavam calados. Outros aplaudiam. Muitos justificavam o injustificável, numa rendição que não foi apenas táctica, mas moral. O mesmo padrão repetiu-se com a guerra na Ucrânia: manipulação mediática, supressão de dissidência e glorificação de uma narrativa única e redutora. A informação tornou-se arma, e os media — supostamente pilares da democracia — tornaram-se extensões do poder político.
Enquanto isso, crescia o descontentamento popular. O voto em figuras como Donald Trump ou em partidos populistas europeus não surgiu do nada. Foi, em larga medida, um grito contra a hipocrisia do sistema. Sim, o populismo tem riscos. Sim, por vezes escorrega para o autoritarismo disfarçado de vontade popular. Mas ignorar a sua origem é não compreender o seu apelo.
É aqui que os liberais clássicos falham novamente. Recusam olhar-se ao espelho. Recusam admitir que a ascensão do populismo é, em parte, culpa sua. Preferem culpar o "populismo ignorante" do eleitorado do que admitir que desertaram dos seus próprios princípios.
E, no entanto, há uma lição urgente a aprender: sem autocrítica, não há redenção liberal.
Se o liberalismo quer recuperar relevância e autoridade, tem de começar por reconhecer a sua traição. Tem de admitir que entre 2020 e 2025 se afastou da liberdade em nome da segurança, da verdade em nome da conveniência e da democracia em nome da tecnocracia.
Trump, por mais controverso que seja, foi um dos poucos líderes ocidentais que se opôs abertamente à censura, ao cancelamento e ao lawfare. Fê-lo por instinto de sobrevivência, não por doutrina liberal. Mas, paradoxalmente, acabou por defender liberdades que os liberais abandonaram. Essa é uma realidade incómoda — mas ignorá-la é abdicar de qualquer hipótese de reerguer o projeto liberal.
Se os liberais querem derrotar os populismos, terão de merecê-lo. E para o merecer, terão primeiro de se penitenciar. Com clareza. Com coragem. E com a humildade de quem sabe que falhou.
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