15 março 2025

Um mártir (15)

 (Continuação daqui)



15. Promessa

Nunca conheci pessoalmente Miguel Macedo mas olhava para ele como uma referência e uma inspiração pelas semelhanças das nossas respectivas relações com a Justiça. Na realidade, eu penso que os meus próprios problemas com a justiça começaram num dia em que fiz um comentário televisivo que envolvia o Processo Vistos Gold, e de que ainda hoje existe um excerto na internet (cf. aqui).

Desde então, segui neste blogue o Processo Vistos Gold e fiz várias referências à sua pessoa, que era o mais mediático dos arguidos, embora o maior mártir tenha sido Manuel Jarmela Palos, o director do SEF que chegou a estar preso preventivamente cinco meses às ordens do juiz Carlos Alexandre e do DCIAP, na altura dirigido pelo magistrado Amadeu Guerra, e que, como Miguel Macedo, acabou absolvido de todos os crimes que lhe eram imputados (cf. aqui).

As semelhanças entre mim e Miguel Macedo, nas nossas respectivas relações com a Justiça, duraram até ao dia da sua morte, aos 65 anos, na passada sexta-feira, 13 de Março, vítima de um infarto do miocárdio. Nesse mesmo dia 13 de Março, mas seis anos anos, em 2019, também aos 65 anos de idade, eu tinha acabado de ser internado na Casa de Saúde da Boavista, no Porto, para ser operado de urgência no dia seguinte, depois de ter sofrido também um infarto do miocárdio. As nossas sortes é que foram diferentes. Ele morreu. Eu apenas fiquei com uma cicatriz de 15 centímetros a dividir-me o peito ao meio.

O stress é um dos principais factores do infarto do miocárdio e, no meu caso, não existem dúvidas de que a batalha que eu então travava na Justiça foi determinante para aquilo que me aconteceu. O caso terá sido muito mais desgastante ainda para Miguel Macedo que, ao longo de cinco anos - tantos quantos durou o Processo Vistos Gold - viveu sob a expectativa de ir para à prisão, o que não era o meu caso.

Na tarde desse mesmo dia 13 de Março de 2019, a minha advogada, sem saber onde me encontrava, telefonou-me a dizer que se tinha realizado nessa manhã a "conferência" no Tribunal da Relação do Porto, onde se juntam juízes, magistrados do MP e advogados para decidir a questão, menos o principal interessado - o réu.

Agradeci a informação mas dei-lhe conta que estava deitado numa cama de hospital à espera de ser operado ao coração às nove da manhã do dia seguinte. O acórdão do TRP foi conhecido duas semanas depois (cf. aqui). Lembro-me da indignação e da impotência que então senti. Os dois lados do meu peito estavam então unidos por uma série de agrafes de metal. Foi como se tudo aquilo de repente tivesse rebentado e eu ficasse aberto ao meio.

Ainda esta quarta-feira, dois dias antes de conhecer a notícia da morte de Miguel Macedo, eu declarava a um pequeno grupo de pessoas familiares com a situação que nunca iria perdoar aquilo que me fizeram. Não há decisão judicial que seja alguma vez suficiente para repôr a justiça. É que, ao contrário de Miguel Macedo, que foi absolvido em primeira instância e a absolvição confirmada em segunda instância, eu fui condenado em primeira instância e a sentença agravada em segunda instância. Só um tribunal internacional me valeu (cf. aqui).

Acredito,  mas não posso assegurar, que nesse mundo ao qual Miguel Macedo hoje ascendeu, exista justiça divina. Mas para o caso de não existir, eu prometo-lhe que continuarei a bater-me para que esses criminosos que existem dentro do sistema de Justiça em Portugal - sejam eles magistrados do MP, juízes ou meros advogados - que, por incompetência ou por maldade (julgo que por maldade, em ambos os nossos casos), acusam ou condenam pessoas inocentes, acabem todos na prisão.

Não o conhecendo, é a única promessa que hoje lhe posso fazer. Eu não darei descanso a essas cavalgaduras.

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