14 dezembro 2024

Almirante Gouveia e Melo (XX)

 (Continuação daqui)




XX. Uma cultura de meninos mimados

O Almirante Gouveia e Melo virá trazer autoridade ao Estado português, em primeiro lugar e, pelo exemplo, à sociedade portuguesa em geral, uma autoridade que corrija e impeça os desmandos da liberdade.

Mas, numa espécie de "moldagem psicológica do campo de batalha", para utilizar uma linguagem que  é cara ao Almirante, a primeira questão a colocar é a seguinte: 

-Qual é o perfil dos portugueses a quem ele vai ter de impôr autoridade e, em certo sentido, coartar a liberdade?

A estatística que mencionei anteriormente (cf. aqui), segundo a qual nos países protestantes os jovens saem de casa dos pais por volta dos 20 anos, enquanto nos países católicos, como Portugal, ficam lá até bem acima dos trinta, ajuda a construir esse perfil.

Existe algo de infantil, acriançado ou adolescente no homem e na mulher portuguesa (segundo as mesmas estatísticas, mais nele do que nela), que o leva até bastante tarde a acomodar-se na casa da família, entregue aos cuidados da mãe e à autoridade do pai, que lhe garantem a satisfação das necessidades básicas - cama, mesa e roupa lavada - sem que ele tenha de se mexer.

O jovem protestante faz-se cedo à vida, tem um grande sentido de independência e de liberdade em relação à família, começa a trabalhar cedo para se sustentar e pagar os estudos, ao passo que o jovem católico fica comodamente instalado na casa dos pais à espera que tudo lhe caia do céu. 

Não será necessário acrescentar mais nada para explicar por que é que nos últimos séculos a produtividade, a inovação, a propensão ao risco e a criação de riqueza têm estado sobretudo nos países protestantes do norte da Europa e nos seus descendentes na América do Norte, e não nos países católicos do sul da Europa e seus descendentes da América Latina. A ética do trabalho - o próprio trabalho como modo de realização pessoal - não são comparáveis entre uns e outros.

Além daquela estatística, existe uma outra que ajuda a tornar mais preciso o retrato das pessoas que o Almirante vai ter de pôr na ordem para cumprir a sua missão de Presidente da República. Refiro-me a uma estatística publicada pelo The Economist relativa à maneira como as crianças são tratadas nos diversos países do mundo (actualmente, cerca de 200).

 Portugal encontra-se no Top-10%, sendo o 17º país do mundo que melhor trata as crianças. Mas existe uma subcategoria onde Portugal tem ainda maior destaque, é aquela relativa à maneira como as crianças são tratadas no seio da família e do grupo de amigos. Portugal é segundo no mundo, logo a seguir à Itália (cf. aquiaqui). 

Conclusão: Portugal é o segundo país do mundo onde as crianças são mais mimadas pela família e pelos amigos. A principal responsável por este resultado é, evidentemente, em termos culturais, a Mãe, quer dizer, a Igreja Católica, que é a figura teológica de Maria. Em concreto, é a mamã portuguesa que só é superada pela célebre mamma italiana. Não há como elas para mimar crianças.

Juntando os diversos elementos, começa a emergir o perfil das pessoas com quem o Almirante vai ter de lidar e pôr na ordem. Ele vai ter de lidar com uma cultura de meninos mimados (mais eles do que elas).

(Continua acolá)

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