13 dezembro 2024

Almirante Gouveia e Melo (XVII)

 (Continuação daqui)




XVII. A democracia

António Campos, um colaborador muito próximo de Mário Soares, e agora militante nº 1 do PS, veio recentemente dizer, por altura do centenário do seu nascimento, que Mário Soares não acreditava na cultura democrática do povo português (cf. aqui).

Mário Soares tinha razão, ele próprio governou e presidiu ao país com tiques próprios de um rei absoluto. Não se pode ter confiança na tradição democrática de um povo que põe no centro da sua capital a estátua do Marquês de Pombal.  E não apenas na sua capital, mas praticamente por todo o país (excepto Braga porque os padres nunca lhe perdoaram). O nome do Marquês nas praças e nas ruas das cidades, vilas e aldeias de Portugal  é a maior homenagem que se pode prestar à cultura anti-democrática do povo português.  

Na década de 1770, enquanto a democracia já se encontrava consolidada nas Ilhas Britânicas e a Inglaterra (onde o Marquês tinha vivido) paria o primeiro país do mundo a nascer democrático; onde, nesse mesmo ano de 1776 da independência americana, Adam Smith, na Escócia, publicava a "A Riqueza das Nações" explicando a ideia do mercado, que representa a transposição para a esfera económica da democracia política, em que  cada um vota com aquilo que tem; nessa década, o Marquês de Pombal, que já tinha nacionalizado a Inquisição, - retirando-a da esfera da Igreja e pondo-a ao serviço do Estado, isto é, ao seu próprio serviço, e dirigida pelo seu próprio irmão entre 1760 e 1770 - governava Portugal como se fosse uma quinta sua.

Eu tenho ficado surpreendido recentemente com o alarido entre os políticos partidários e os comentadores políticos, senão mesmo com o horror que está a causar a ideia de que o Almirante Gouveia e Melo poderá vir a ser o próximo Presidente da República. Trata-se de uma atitude que só é explicável pela falta de tradição democrática dos próprios políticos e comentadores que, afinal, também são parte do povo português.

O Almirante não vai ser posto no cargo por virtude de algum golpe militar ou por decisão de algum rei absoluto. O Almirante vai ser posto no cargo pelo voto democrático - e, na minha opinião, largamente maioritário - do povo português. Um verdadeiro democrata não tem nada a recear acerca disto. Será a democracia a legitimar o Almirante.

(Continua acolá)

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